Pescado à linha
Após o surpreendente resultado de Fernando Nobre nas presidenciais, fiquei com uma certeza. Hoje, se o “Rato Mickey” se candidatar a eleições em Portugal, com uma plataforma programática suficientemente confusa e centrar o essencial do seu discurso na crítica aos partidos, arrisca-se a ter 10% dos votos. O terreno está fértil para quem ataque ou parodie o sistema político e, como se tem visto nas últimas semanas, com o triste espectáculo de cacofonia em torno do resgate financeiro, os partidos não perdem uma oportunidade para confirmar a má opinião que deles se faz. Nobre foi mais um a pôr-se de fora e a lucrar eleitoralmente com essa atitude. Mas se há quinze dias sabíamos que Nobre era crítico dos partidos, esta semana ficámos a saber que, no fundo, o problema dos partidos era simples: nunca o haviam convidado para um cargo à sua altura.
Entretanto, foram sendo recuperadas declarações de Nobre revelando as contradições de quem já apoiou quase todos os partidos, num notável curto espaço de tempo. Peço desculpa, mas o problema que Nobre coloca ao PSD não é propriamente esse. O que está em causa é algo de mais estrutural e que tem a ver com a relação dos partidos com os independentes – que, aliás, são cooptados exactamente para darem uma imagem de pluralismo face à linha oficial dos partidos.
O problema não são as contradições de Nobre ou as posições divergentes face ao PSD, o que é lamentável é que os partidos pesquem independentes à linha, interiorizando as críticas que lhes são feitas, enquanto, ao fazerem-no, aproveitam para não enfrentarem nenhum dos problemas estruturais que levam a que, cada vez menos, as pessoas reconheçam os partidos como seus representantes legítimos.
O problema dos partidos portugueses nunca passou pela capacidade de alargamento, recrutando para as suas listas o independente A ou B, que ganhou notoriedade por uma qualquer razão. Pelo contrário, não só todos os partidos o fazem, como não me parece que tenham dificuldade em encontrar protagonistas disponíveis para representar o papel. Uma ténue réstia de esperança na regeneração da vida partidária depende de outros factores: por um lado, saber se os partidos são ou não capazes de representar e acomodar interesses orgânicos, em lugar de procurar compensar o seu fechamento através de lógicas fulanizadas de envolvimento de independentes; por outro, se conseguem abandonar a volatilidade programática e a definição de políticas feita ad hoc, substituindo-as por processos estáveis, participados e que não violentem a sua relação com os eleitores.
A pesca de Nobre à linha pelo PSD não só não contribuiu para enfrentar nenhum destes problemas, como produziu dois efeitos negativos: criou mais uma dificuldade a Passos Coelho e frustrou as expectativas dos apoiantes de Nobre nas presidenciais, que se habituaram a que este dissesse cobras e lagartos dos partidos e que agora o vêem cair no regaço do inimigo de ontem.
publicado no Expresso de 16 de Abril
Entretanto, foram sendo recuperadas declarações de Nobre revelando as contradições de quem já apoiou quase todos os partidos, num notável curto espaço de tempo. Peço desculpa, mas o problema que Nobre coloca ao PSD não é propriamente esse. O que está em causa é algo de mais estrutural e que tem a ver com a relação dos partidos com os independentes – que, aliás, são cooptados exactamente para darem uma imagem de pluralismo face à linha oficial dos partidos.
O problema não são as contradições de Nobre ou as posições divergentes face ao PSD, o que é lamentável é que os partidos pesquem independentes à linha, interiorizando as críticas que lhes são feitas, enquanto, ao fazerem-no, aproveitam para não enfrentarem nenhum dos problemas estruturais que levam a que, cada vez menos, as pessoas reconheçam os partidos como seus representantes legítimos.
O problema dos partidos portugueses nunca passou pela capacidade de alargamento, recrutando para as suas listas o independente A ou B, que ganhou notoriedade por uma qualquer razão. Pelo contrário, não só todos os partidos o fazem, como não me parece que tenham dificuldade em encontrar protagonistas disponíveis para representar o papel. Uma ténue réstia de esperança na regeneração da vida partidária depende de outros factores: por um lado, saber se os partidos são ou não capazes de representar e acomodar interesses orgânicos, em lugar de procurar compensar o seu fechamento através de lógicas fulanizadas de envolvimento de independentes; por outro, se conseguem abandonar a volatilidade programática e a definição de políticas feita ad hoc, substituindo-as por processos estáveis, participados e que não violentem a sua relação com os eleitores.
A pesca de Nobre à linha pelo PSD não só não contribuiu para enfrentar nenhum destes problemas, como produziu dois efeitos negativos: criou mais uma dificuldade a Passos Coelho e frustrou as expectativas dos apoiantes de Nobre nas presidenciais, que se habituaram a que este dissesse cobras e lagartos dos partidos e que agora o vêem cair no regaço do inimigo de ontem.
publicado no Expresso de 16 de Abril