o cheque em branco
O candidato Cavaco Silva tem montada uma estratégia de campanha bastante profissional. Não falar é a ideia-chave. Não por acaso, quando durante oito minutos apresentou a sua candidatura, aproveitou logo para dizer que não teria porta-voz. Estava dado o primeiro passo. Depois do tabu, o candidato não falaria, nem ninguém por ele. A situação gerou naturalmente momentos caricatos, à cabeça os protagonizados pela sua mandatária para a juventude, que se recusa a debater ou, ainda, as perguntas por escrito feitas aos candidatos que ora ficam sem resposta, ora são respondidas na terceira pessoa (”o Prof. Cavaco Silva pensa...”).
Mas esta semana, com a entrevista à TVI, a expectativa era que o candidato falasse e se comprometesse com alguma coisa. Eis o que se passou: Sobre a dissolução do Parlamento e consequente queda do Governo de Santana Lopes, disse que só Jorge Sampaio é que estava na posse de todos os dados; sobre o actual Governo, afirmou ser ainda cedo para avaliá-lo; sobre o Orçamento de Estado disse que era incorrecto fazer uma apreciação, tendo em conta que ainda se encontra em funções o Presidente Sampaio. Nada disto surpreende. O primeiro-ministro que fugia dos debates, transformou-se no proto-candidato que geria silêncios e agora no candidato que quando fala apenas diz vacuidades, fingindo pairar acima de tudo. Inclusive dos problemas concretos com que se confronta um Presidente da República. Para Cavaco Silva, o melhor era que não houvesse campanha e que fosse, desde já, entronizado Presidente da República.
Esta táctica tem, naturalmente, a ver com as características peculiares do candidato. Mas o que esconde é também uma outra coisa. Cavaco sabe que para superar os 46% que teve há dez anos precisa de fazer uma de duas coisas: ou gerir um silêncio em que não se compromete com nada, ou, em alternativa, revelar um jogo de cintura que lhe permita, ao mesmo tempo, fixar o eleitorado de direita não alienando aquele que está ao centro.
Acontece que Cavaco Silva não tem margem para esse jogo de cintura. Se, mesmo que por tacticismo, diz alguma coisa que possa parecer mais próximo do Governo de José Sócrates, logo coloca em causa as ambições governativas do PSD. Se revela sensibilidade (tardia) para que a Guerra do Iraque foi um erro insensato, logo os “bushistas” que o apoiam se sentirão defraudados.
Com uma direcção e comissão políticas inequivocamente de direita e que reproduzem em tudo a sua candidatura de há dez anos, Cavaco Silva sabe que a manta que cobre a sua plataforma eleitoral é curta. Se tapa à direita, logo destapa ao centro e, se tapa ao centro, logo deixa a direita descoberta. O silêncio que tem caracterizado a sua campanha é fruto deste dilema. Ao tudo querer abarcar, Cavaco Silva corre o risco de não mobilizar claramente ninguém. É um problema típico das campanhas muito certinhas e que seguem todas as regras dos manuais: perdem autenticidade e incorrem no risco de não agradar a nenhum dos seus diferentes segmentos de apoiantes.
Contudo, a estratégia do silêncio – que aliás não é novidade em actos eleitorais em Portugal – acarreta um risco bem maior e que vai para além das opções entre candidatos presidenciais. No caso concreto destas eleições, há o perigo de conferir um mandato a um candidato que nada diz sobre aquilo que é de facto o seu conteúdo funcional (nem sequer retrospectivamente ficamos a saber como agiria) e que, ao mesmo tempo, se escuda em declarações programáticas que estão fora das competências do Presidente da República, tal como previstas pela Constituição. Ao não se conhecer com clareza o que um candidato pretende fazer, votar nele é passar um cheque em branco. E a última coisa que o país precisava, a somar à crise económica e social, era de desresponsabilização política. Sem que se saiba exactamente o que é que os candidatos presidenciais pretendem de facto fazer, é impossível antecipar a sua acção e avaliá-la eleitoralmente, quando for caso disso.
publicado no Diário Económico.
Mas esta semana, com a entrevista à TVI, a expectativa era que o candidato falasse e se comprometesse com alguma coisa. Eis o que se passou: Sobre a dissolução do Parlamento e consequente queda do Governo de Santana Lopes, disse que só Jorge Sampaio é que estava na posse de todos os dados; sobre o actual Governo, afirmou ser ainda cedo para avaliá-lo; sobre o Orçamento de Estado disse que era incorrecto fazer uma apreciação, tendo em conta que ainda se encontra em funções o Presidente Sampaio. Nada disto surpreende. O primeiro-ministro que fugia dos debates, transformou-se no proto-candidato que geria silêncios e agora no candidato que quando fala apenas diz vacuidades, fingindo pairar acima de tudo. Inclusive dos problemas concretos com que se confronta um Presidente da República. Para Cavaco Silva, o melhor era que não houvesse campanha e que fosse, desde já, entronizado Presidente da República.
Esta táctica tem, naturalmente, a ver com as características peculiares do candidato. Mas o que esconde é também uma outra coisa. Cavaco sabe que para superar os 46% que teve há dez anos precisa de fazer uma de duas coisas: ou gerir um silêncio em que não se compromete com nada, ou, em alternativa, revelar um jogo de cintura que lhe permita, ao mesmo tempo, fixar o eleitorado de direita não alienando aquele que está ao centro.
Acontece que Cavaco Silva não tem margem para esse jogo de cintura. Se, mesmo que por tacticismo, diz alguma coisa que possa parecer mais próximo do Governo de José Sócrates, logo coloca em causa as ambições governativas do PSD. Se revela sensibilidade (tardia) para que a Guerra do Iraque foi um erro insensato, logo os “bushistas” que o apoiam se sentirão defraudados.
Com uma direcção e comissão políticas inequivocamente de direita e que reproduzem em tudo a sua candidatura de há dez anos, Cavaco Silva sabe que a manta que cobre a sua plataforma eleitoral é curta. Se tapa à direita, logo destapa ao centro e, se tapa ao centro, logo deixa a direita descoberta. O silêncio que tem caracterizado a sua campanha é fruto deste dilema. Ao tudo querer abarcar, Cavaco Silva corre o risco de não mobilizar claramente ninguém. É um problema típico das campanhas muito certinhas e que seguem todas as regras dos manuais: perdem autenticidade e incorrem no risco de não agradar a nenhum dos seus diferentes segmentos de apoiantes.
Contudo, a estratégia do silêncio – que aliás não é novidade em actos eleitorais em Portugal – acarreta um risco bem maior e que vai para além das opções entre candidatos presidenciais. No caso concreto destas eleições, há o perigo de conferir um mandato a um candidato que nada diz sobre aquilo que é de facto o seu conteúdo funcional (nem sequer retrospectivamente ficamos a saber como agiria) e que, ao mesmo tempo, se escuda em declarações programáticas que estão fora das competências do Presidente da República, tal como previstas pela Constituição. Ao não se conhecer com clareza o que um candidato pretende fazer, votar nele é passar um cheque em branco. E a última coisa que o país precisava, a somar à crise económica e social, era de desresponsabilização política. Sem que se saiba exactamente o que é que os candidatos presidenciais pretendem de facto fazer, é impossível antecipar a sua acção e avaliá-la eleitoralmente, quando for caso disso.
publicado no Diário Económico.
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