Resistir? Não tanto
Um
dos efeitos estruturais da crise nos países da Europa do sul é a lenta
desagregação dos sistemas partidários tal como consolidados com a transição
para a democracia. Com intensidades diferentes, temos assistido na Grécia,
Itália, Espanha e Portugal a uma queda acentuada dos partidos que tiveram
responsabilidades governativas nas últimas décadas. Faz sentido. Nestes países,
o código genético dos partidos de Governo está indelevelmente marcado pela
defesa da integração europeia e por uma melhoria das condições materiais de
vida, associada à expansão do Estado social. Com a desestruturação em curso do
projeto europeu e com um declínio acelerado dos níveis de vida, é natural que
estes partidos vejam a sua legitimidade ferida.
Os
valores mais impressivos são os da Grécia. Se em 2009 as votações conjugadas da
Nova Democracia e do PASOK se aproximavam dos 80% dos votos, em 2012 caíram
para os 40%. Mas a tendência tem manifestações semelhantes nos restantes
países: em Itália, o partido mais votado nas últimas legislativas foi um
movimento liderado por um palhaço, enquanto Força Itália e Partido Democrático
– eles próprios partidos jovens – agonizavam em redor dos 20%. Espanha e
Portugal são, a este propósito, países em situações distintas. Nos dois casos,
as últimas legislativas ainda foram disputadas de acordo com os ciclos
tradicionais de alternância, permitindo o regresso ao poder dos partidos de
centro-direita, PSD e PP. Contudo, os sinais dos últimos dois anos colocam o
sistema partidário espanhol e português na rota dos seus parceiros do sul.
Se
tomarmos como boas as sondagens, percebemos que em Espanha uma queda muito
acentuada do partido do Governo, o PP, de 45% nas legislativas para 25% nas
últimas sondagens, não foi acompanhada por uma subida das intenções de voto no
PSOE - teve 29% nas eleições e agora não descola dos 20%. Tal como na Grécia,
PP e PSOE juntos deixaram de valer cerca de 70% dos votos, caindo para os 40%.
Portugal
parece ser um caso distinto, com PSD e PS a revelarem, comparativamente, uma
resiliência surpreendente. Aliás, o politólogo da London School of Economics
Alexandre Afonso enunciava, num
interessante artigo, algumas explicações para a diferença entre Grécia e
Portugal. Por um lado, o sistema partidário grego assentava numa cultura de
clientelismo inexistente, com a mesma escala, entre nós, que se tornou inviável
com níveis elevados de austeridade; por outro, a própria austeridade em
Portugal foi negociada entre os vários partidos, dificultando a atribuição de responsabilidades,
logo protegendo os partidos.
O
problema é que 2011 é já um mau barómetro das tendências. Se olharmos para a
média das sondagens calculada por Pedro Magalhães, PS e PSD têm hoje 60% das
intenções de voto, aproximadamente menos 10 p.p. do que nas últimas
legislativas. A este propósito, as próximas autárquicas podem ser um teste
interessante, em que dinâmica cíclica (penalização eleitoral dos partidos do
Governo) se pode combinar com transformação estrutural (queda eleitoral
conjugada de PS/PSD/CDS). Uma reflexão que fica para a próxima semana.
publicado no Expresso de 17 de Agosto
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