Sair, ficando
A decisão “saio, mas fico” de Manuel Alegre acabou por ser a melhor solução para todos. Para Alegre, que mantém a autonomia face a Sócrates e para Sócrates, que não fica mais fragilizado à esquerda.
Até porque Alegre, depois das críticas substantivas e do distanciamento em questões centrais da Governação (ex. o código do trabalho), sairia descredibilizado se aceitasse integrar as listas ao Parlamento, ao mesmo tempo que essa decisão de pouco serviria a Sócrates. Mas para além da personalização, há questões mais relevantes suscitadas pela relação tensa entre Alegre e o PS.
Pese embora as sondagens dos últimos anos revelarem uma pulverização eleitoral sem paralelo nos últimos anos, as eleições europeias encarregar-se-ão de fazer regressar a bipolarização. Uma bipolarização que, no essencial, não assentará em transferências de votos entre campos políticos mas que ocorrerá, por um lado, entre partidos de direita e, por outro, entre partidos de esquerda. Quando chegarem as legislativas, o que vai estar de facto em causa é uma escolha entre uma vitória do PS e uma vitória do PSD - cenário tanto mais credível quanto maior for a proximidade entre os dois nas europeias.
Na sexta-feira, Alegre afirmou que "não entrará em nenhum combate para derrotar o PS e que estará sempre ao lado dos socialistas numa luta eleitoral contra a direita". Ora, esta declaração não apenas sugere que Alegre se envolverá na escolha do próximo Governo, como, pelo peso político que, de facto, adquiriu, ajudará a definir os termos em que ela ocorrerá, condicionando a linha discursiva do PS para a campanha eleitoral. Com o PSD com resultados em redor dos vinte e pouco por cento e com um peso igual ao dos votos somados no PCP e no BE, o PS podia fazer uma campanha em que "malhava" de modo igual à esquerda e à direita. A partir do momento que o PSD começa a concentrar os votos da direita, o PS precisa de mobilizar os votos do seu campo político e apostar de novo na bipolarização.
Nesse exercício, Sócrates beneficia da competição directa com Ferreira Leite, na medida em que é o único que é, de facto, percepcionado como sendo candidato a primeiro-ministro. Mas não basta. É preciso que os portugueses, e nomeadamente os que votaram PS mas que agora se sentem menos ou nada inclinados para voltar a fazê-lo, por um lado, sintam que o regresso do PSD ao poder é um mal maior do que um novo Governo PS e, por outro, que os socialistas se revelem capazes de apresentar um programa de resposta à crise económica e social, para além das soluções de emergência que têm dominado a agenda. Manuel Alegre, simpatizemos ou não com o seu percurso político e com as suas opções recentes, pode ser determinante para o PS concretizar este duplo objectivo. O que só serve para provar que, por vezes, estar fora acaba mesmo por ser a melhor forma de ter mais peso interno.
publicado no Diário Económico.
Até porque Alegre, depois das críticas substantivas e do distanciamento em questões centrais da Governação (ex. o código do trabalho), sairia descredibilizado se aceitasse integrar as listas ao Parlamento, ao mesmo tempo que essa decisão de pouco serviria a Sócrates. Mas para além da personalização, há questões mais relevantes suscitadas pela relação tensa entre Alegre e o PS.
Pese embora as sondagens dos últimos anos revelarem uma pulverização eleitoral sem paralelo nos últimos anos, as eleições europeias encarregar-se-ão de fazer regressar a bipolarização. Uma bipolarização que, no essencial, não assentará em transferências de votos entre campos políticos mas que ocorrerá, por um lado, entre partidos de direita e, por outro, entre partidos de esquerda. Quando chegarem as legislativas, o que vai estar de facto em causa é uma escolha entre uma vitória do PS e uma vitória do PSD - cenário tanto mais credível quanto maior for a proximidade entre os dois nas europeias.
Na sexta-feira, Alegre afirmou que "não entrará em nenhum combate para derrotar o PS e que estará sempre ao lado dos socialistas numa luta eleitoral contra a direita". Ora, esta declaração não apenas sugere que Alegre se envolverá na escolha do próximo Governo, como, pelo peso político que, de facto, adquiriu, ajudará a definir os termos em que ela ocorrerá, condicionando a linha discursiva do PS para a campanha eleitoral. Com o PSD com resultados em redor dos vinte e pouco por cento e com um peso igual ao dos votos somados no PCP e no BE, o PS podia fazer uma campanha em que "malhava" de modo igual à esquerda e à direita. A partir do momento que o PSD começa a concentrar os votos da direita, o PS precisa de mobilizar os votos do seu campo político e apostar de novo na bipolarização.
Nesse exercício, Sócrates beneficia da competição directa com Ferreira Leite, na medida em que é o único que é, de facto, percepcionado como sendo candidato a primeiro-ministro. Mas não basta. É preciso que os portugueses, e nomeadamente os que votaram PS mas que agora se sentem menos ou nada inclinados para voltar a fazê-lo, por um lado, sintam que o regresso do PSD ao poder é um mal maior do que um novo Governo PS e, por outro, que os socialistas se revelem capazes de apresentar um programa de resposta à crise económica e social, para além das soluções de emergência que têm dominado a agenda. Manuel Alegre, simpatizemos ou não com o seu percurso político e com as suas opções recentes, pode ser determinante para o PS concretizar este duplo objectivo. O que só serve para provar que, por vezes, estar fora acaba mesmo por ser a melhor forma de ter mais peso interno.
publicado no Diário Económico.
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