Uma revolução tranquila
Nada diminui tanto a nossa capacidade colectiva como país e o potencial individual de muitos portugueses como o défice de qualificações.
De acordo com dados da OCDE, apenas 28,3% dos portugueses tinha um grau de escolaridade equivalente ao ensino secundário, o valor mais baixo dos países da organização. Estes números têm consequências reais: por um lado, contribuem para a reprodução geracional da desigualdade naquela que é a sociedade mais desigual da Europa; por outro, colocam em risco a capacidade adaptativa do nosso tecido económico. Aliás, ainda de acordo com estimativas da OCDE, o PIB português poderia ter crescido mais 1,2 pontos percentuais por ano, entre as décadas de 1970 a 1990, se os nossos níveis de escolaridade estivessem equiparados à média.
À partida, este contexto obrigaria a que já há muito tempo se tivesse avançado no alargamento da escolaridade obrigatória para os 18 anos. Acontece que não se mudam as sociedades por decreto e caso se tivesse decidido alargar a escolaridade obrigatória sem dar outros passos prévios, muito provavelmente a consequência seria um incremento do abandono escolar precoce (outra das chagas nacionais).
Numa sociedade com défices de qualificação assentes num pesado lastro geracional, a generalização da escolaridade só é exequível se assentar em importante medida nas vias profissionalizantes. Ora também neste aspecto Portugal tem um défice crónico: enquanto, entre nós, a percentagem de alunos do secundário que, em 2001, frequentava as vias vocacionais se situava em redor dos 23%, na média da OCDE essa mesma percentagem era de 47,5% e na média da UE, de 60%. É por isso que a aposta nas vias profissionalizantes enquanto instrumento central para a promoção da qualificação foi não só o mais importante dos passos prévios que torna hoje possível o alargamento da escolaridade obrigatória, como tem sido uma autêntica revolução tranquila, um processo reformista silencioso, mas que vai à raiz dos nossos défices estruturais.
A generalização dos cursos profissionalizantes, ao mesmo tempo que contrariou a subalternização dos saberes operativos por relação aos abstractos no nosso sistema educativo, revelou-se decisiva para que nos últimos anos se tivesse assistido a um aumento da frequência escolar em todos os escalões etários. Por exemplo, matricularam-se este ano, no 10º ano, em vias profissionalizantes, cerca de 50% dos alunos, quando, no passado recente, esse valor não ultrapassava os 30%.
Contudo, o alargamento da escolaridade obrigatória não deve ser feito sem que exista um consenso entre as principais forças políticas e sem que se cuide de planificar os passos que têm de ser dados. E quanto a este aspecto, sobram ainda muitas questões e poucas respostas. O que nos recorda que há outra dimensão em que temos de contrariar um défice crónico: a planificação das políticas públicas.
publicado no Diário Económico.
De acordo com dados da OCDE, apenas 28,3% dos portugueses tinha um grau de escolaridade equivalente ao ensino secundário, o valor mais baixo dos países da organização. Estes números têm consequências reais: por um lado, contribuem para a reprodução geracional da desigualdade naquela que é a sociedade mais desigual da Europa; por outro, colocam em risco a capacidade adaptativa do nosso tecido económico. Aliás, ainda de acordo com estimativas da OCDE, o PIB português poderia ter crescido mais 1,2 pontos percentuais por ano, entre as décadas de 1970 a 1990, se os nossos níveis de escolaridade estivessem equiparados à média.
À partida, este contexto obrigaria a que já há muito tempo se tivesse avançado no alargamento da escolaridade obrigatória para os 18 anos. Acontece que não se mudam as sociedades por decreto e caso se tivesse decidido alargar a escolaridade obrigatória sem dar outros passos prévios, muito provavelmente a consequência seria um incremento do abandono escolar precoce (outra das chagas nacionais).
Numa sociedade com défices de qualificação assentes num pesado lastro geracional, a generalização da escolaridade só é exequível se assentar em importante medida nas vias profissionalizantes. Ora também neste aspecto Portugal tem um défice crónico: enquanto, entre nós, a percentagem de alunos do secundário que, em 2001, frequentava as vias vocacionais se situava em redor dos 23%, na média da OCDE essa mesma percentagem era de 47,5% e na média da UE, de 60%. É por isso que a aposta nas vias profissionalizantes enquanto instrumento central para a promoção da qualificação foi não só o mais importante dos passos prévios que torna hoje possível o alargamento da escolaridade obrigatória, como tem sido uma autêntica revolução tranquila, um processo reformista silencioso, mas que vai à raiz dos nossos défices estruturais.
A generalização dos cursos profissionalizantes, ao mesmo tempo que contrariou a subalternização dos saberes operativos por relação aos abstractos no nosso sistema educativo, revelou-se decisiva para que nos últimos anos se tivesse assistido a um aumento da frequência escolar em todos os escalões etários. Por exemplo, matricularam-se este ano, no 10º ano, em vias profissionalizantes, cerca de 50% dos alunos, quando, no passado recente, esse valor não ultrapassava os 30%.
Contudo, o alargamento da escolaridade obrigatória não deve ser feito sem que exista um consenso entre as principais forças políticas e sem que se cuide de planificar os passos que têm de ser dados. E quanto a este aspecto, sobram ainda muitas questões e poucas respostas. O que nos recorda que há outra dimensão em que temos de contrariar um défice crónico: a planificação das políticas públicas.
publicado no Diário Económico.
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