O Pacto do PSD
Há pouco mais de um mês, parecia que Marques Mendes enfrentaria o pior cenário possível. Ser candidato único à liderança do PSD. O sinal era então claro: ninguém queria ir a jogo, era cedo de mais. Depois, a história é conhecida, enquanto a “terceira-via” se encolhia, Menezes avançava. Marques Mendes deixou de estar sozinho num campo armadilhado. Mas será que faz assim tanta diferença?
Não faz. É muito provável que Marques Mendes vença as eleições internas. Mas vai vencer com base num pacto que não augura nada de bom. Se soma hoje apoios vindos de todos os quadrantes internos é pela convergência táctica de dois objectivos: impedir que Luís Filipe Menezes lidere o PSD e fazer de Marques Mendes o candidato nas próximas legislativas, antecipando uma derrota. Só assim se percebe, por exemplo, as manifestas desautorizações de que este foi alvo por dois dos redactores da sua moção estratégica (Dias Loureiro e Eduardo Catroga).
Esta subserviência ao tacticismo é um sintoma dos equívocos em que assenta hoje o PSD. Não será certamente pela medição de aplausos na festa do Pontal ou pela soma de apoios de barões que o partido se tornará eleitoralmente competitivo. O que o PSD precisa é de voltar a discutir política e encontrar elementos distintivos face ao PS. É um facto que não é fácil fazê-lo, mas talvez fosse boa ideia tentar.
Desse ponto de vista, vale a pena comparar as eleições internas do PSD hoje, com aquelas que ocorreram no PS há três anos.
É natural que a disputa entre José Sócrates e Manuel Alegre tenha tido o conjunto de incidentes que caracterizam as escolhas dentro dos partidos (aliás, como se tem visto no caso do BCP, as trocas de acusações processuais parecem ser uma “lei de ferro” das disputas de poder nas grandes organizações). Ainda assim, ficou claro que estava em causa a escolha entre dois caminhos estratégicos para o PS. De um lado, uma recentragem do partido com Sócrates e a opção por uma maioria absoluta; de outro, um percurso mais à esquerda com Alegre e a disponibilidade de avançar para coligações. Estas opções tinham consequências no tipo de papel que era defendido para o Estado, bem como nas escolhas em torno das políticas. A opção dos militantes foi nítida e a clarificação foi inclusivamente útil para a formação do que viria a ser o programa eleitoral para as legislativas de 2005.
Já no caso do PSD é com dificuldade que se percebe quais são os elementos estratégicos que distinguem a candidatura de Marques Mendes da de Luís Filipe Menezes. Provavelmente eles existem, mas só um espectador muito atento é que os poderá conseguir destrinçar. Até porque entre Menezes que quer, simultaneamente, manter o serviço nacional de saúde gratuito, ocupar a rua à imagem da CGTP e diminuir o papel do Estado e Marques Mendes que vai à Madeira elogiar Jardim para logo depois ir ao Algarve defender a regionalização, pasme-se, do Algarve, enquanto faz da credibilidade lema, as diferenças são poucas e as clivagens nenhumas.
Enquanto as eleições internas do PS serviram para reforçar o partido e clarificar as distinções estratégicas, as eleições internas do PSD só estão a servir para fragilizar os sociais-democratas e tornar ainda mais visível a sua ausência de rumo estratégico. E não tenhamos ilusões, enquanto o PSD não clarificar o seu rumo, se posicionar politicamente e ultrapassar os problemas que ainda persistem dos Governos Durão/Portas/Santana, a sua competitividade eleitoral será fraca.
O estranho é que este contexto parece ser do agrado de muitas das figuras do PSD, que assinaram um pacto não-escrito, preferindo esperar, em lugar de dar a cara agora. Podem, contudo, estar a cometer um erro de avaliação: não só a política portuguesa é cada vez mais volátil, como o PSD pode estar a chegar a um ponto de não retorno. Quer Marques Mendes, quer Luís Filipe Menezes arriscam tornar-se inamovíveis. O primeiro se tiver um resultado que chegue para retirar a maioria absoluta a Sócrates em 2009 e o segundo se alcançar uma votação interna em redor dos 40%. Se assim for, quem espera liderar o partido no futuro, terá de contar com a presença forte de ambos daqui a dois anos. Resta saber se todas as forças são conciliáveis e se ainda vai ser possível chegar a uma síntese que torne o PSD de novo ganhador.
publicado no Diário Económico.
Não faz. É muito provável que Marques Mendes vença as eleições internas. Mas vai vencer com base num pacto que não augura nada de bom. Se soma hoje apoios vindos de todos os quadrantes internos é pela convergência táctica de dois objectivos: impedir que Luís Filipe Menezes lidere o PSD e fazer de Marques Mendes o candidato nas próximas legislativas, antecipando uma derrota. Só assim se percebe, por exemplo, as manifestas desautorizações de que este foi alvo por dois dos redactores da sua moção estratégica (Dias Loureiro e Eduardo Catroga).
Esta subserviência ao tacticismo é um sintoma dos equívocos em que assenta hoje o PSD. Não será certamente pela medição de aplausos na festa do Pontal ou pela soma de apoios de barões que o partido se tornará eleitoralmente competitivo. O que o PSD precisa é de voltar a discutir política e encontrar elementos distintivos face ao PS. É um facto que não é fácil fazê-lo, mas talvez fosse boa ideia tentar.
Desse ponto de vista, vale a pena comparar as eleições internas do PSD hoje, com aquelas que ocorreram no PS há três anos.
É natural que a disputa entre José Sócrates e Manuel Alegre tenha tido o conjunto de incidentes que caracterizam as escolhas dentro dos partidos (aliás, como se tem visto no caso do BCP, as trocas de acusações processuais parecem ser uma “lei de ferro” das disputas de poder nas grandes organizações). Ainda assim, ficou claro que estava em causa a escolha entre dois caminhos estratégicos para o PS. De um lado, uma recentragem do partido com Sócrates e a opção por uma maioria absoluta; de outro, um percurso mais à esquerda com Alegre e a disponibilidade de avançar para coligações. Estas opções tinham consequências no tipo de papel que era defendido para o Estado, bem como nas escolhas em torno das políticas. A opção dos militantes foi nítida e a clarificação foi inclusivamente útil para a formação do que viria a ser o programa eleitoral para as legislativas de 2005.
Já no caso do PSD é com dificuldade que se percebe quais são os elementos estratégicos que distinguem a candidatura de Marques Mendes da de Luís Filipe Menezes. Provavelmente eles existem, mas só um espectador muito atento é que os poderá conseguir destrinçar. Até porque entre Menezes que quer, simultaneamente, manter o serviço nacional de saúde gratuito, ocupar a rua à imagem da CGTP e diminuir o papel do Estado e Marques Mendes que vai à Madeira elogiar Jardim para logo depois ir ao Algarve defender a regionalização, pasme-se, do Algarve, enquanto faz da credibilidade lema, as diferenças são poucas e as clivagens nenhumas.
Enquanto as eleições internas do PS serviram para reforçar o partido e clarificar as distinções estratégicas, as eleições internas do PSD só estão a servir para fragilizar os sociais-democratas e tornar ainda mais visível a sua ausência de rumo estratégico. E não tenhamos ilusões, enquanto o PSD não clarificar o seu rumo, se posicionar politicamente e ultrapassar os problemas que ainda persistem dos Governos Durão/Portas/Santana, a sua competitividade eleitoral será fraca.
O estranho é que este contexto parece ser do agrado de muitas das figuras do PSD, que assinaram um pacto não-escrito, preferindo esperar, em lugar de dar a cara agora. Podem, contudo, estar a cometer um erro de avaliação: não só a política portuguesa é cada vez mais volátil, como o PSD pode estar a chegar a um ponto de não retorno. Quer Marques Mendes, quer Luís Filipe Menezes arriscam tornar-se inamovíveis. O primeiro se tiver um resultado que chegue para retirar a maioria absoluta a Sócrates em 2009 e o segundo se alcançar uma votação interna em redor dos 40%. Se assim for, quem espera liderar o partido no futuro, terá de contar com a presença forte de ambos daqui a dois anos. Resta saber se todas as forças são conciliáveis e se ainda vai ser possível chegar a uma síntese que torne o PSD de novo ganhador.
publicado no Diário Económico.
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