Soluções Partilhadas
Não é nova a tendência nacional para importar modelos. O paradigma a nacionalizar é que foi mudando, de acordo com as preferências políticas domésticas. Quem julga que o caminho português deve passar por aumentar a competitividade fiscal, elogia a opção irlandesa; aqueles que pensam que é desregulando o mercado de trabalho que a nossa economia tem futuro, enaltecem as virtudes britânicas; quem defende que o que há que fazer é flexibilizar a legislação laboral, compensando com mais protecção social, aponta os casos holandês e dinamarquês; os que apostam na necessidade de alteração do padrão de especialização, procuram emular a Finlândia.
Provavelmente para que a economia portuguesa tenha futuro, há que aprender com todas as soluções, mas com sensibilidade à especificidade nacional. As importações acríticas vêm sempre acompanhadas de uma propensão para a engenharia social. Ambas são invariavelmente más conselheiras.
Mas uma coisa é copiar políticas, esquecendo as tradições institucionais existentes no nosso país e os equilíbrios muito sensíveis em que assenta a economia portuguesa e consequentemente o nosso tecido social. Outra é aprender com os processos políticos que permitiram a alguns países europeus ultrapassar os bloqueios que enfrentaram no passado.
Se o caminho irlandês, dinamarquês, holandês e finlandês (e aqui a excepção é o Reino Unido) tem algo em comum, é o facto de as reformas terem assentado em processos negociados e em opções partilhadas por Governos e parceiros sociais, sob a forma de pactos sociais.
Apesar de já ter sido assinada uma mão-cheia de pactos sociais em Portugal, a verdade é que temos uma tradição muito fraca de negociação tripartida. Entre nós, quando Governo, patrões e sindicatos negoceiam, fazem-no defendendo intransigentemente a sua posição de partida. Quando os pactos são finalmente celebrados, ou reflectem a posição de parte dos interessados ou têm um alcance muito limitado.
Um pacto social eficaz requer partilha de vulnerabilidades e disponibilidade para alcançar soluções, nas quais todas as partes se afastem das posições de partida. Desse ponto de vista, o ”acordo de médio alcance” celebrado a semana passada sobre o subsídio de desemprego representa um passo em frente. Mas um passo circunscrito, ainda que a uma matéria muito relevante.
Com o ”livro verde sobre as relações laborais” apresentado hoje, abre-se uma nova janela de responsabilidade para Governo e parceiros sociais. Nenhuma das partes negará que a regulação do mercado de trabalho apresenta entre nós uma série de problemas (por ex., rigidez formal com flexibilidade de facto, que nos coloca no pior dos dois mundos; negociação colectiva conservadora e excessivamente centrada nas questões salariais e de tempo de trabalho; ou incapacidade de promover a inovação no mundo laboral). Neste sentido, o livro verde pode funcionar, antes de mais, como um importante instrumento de partilha de informação. Não menos importante, pode ajudar a colocar fim a algumas ideias sistematicamente repetidas, sem que sejam sujeitas a teste empírico e nas quais assenta muita da rigidez negocial das partes. A partilha de informação é mais importante do que aquilo que pode aparentar.
O que Governo e parceiros sociais têm à frente não é mais uma oportunidade para ajudar a desbloquear a economia portuguesa. É uma responsabilidade. Agora importa que saibam abandonar os papéis que se habituaram teimosamente a assumir: patrões devem esquecer a sua agenda frequentemente míope e com pouca capacidade de inovação; sindicatos devem abandonar a combinação de conservadorismo com irrealismo com que partem para a negociação; e Governo deve continuar nesta área a ter uma posição de abertura negocial - aliás contrastante com o voluntarismo unilateral que tem caracterizado muita da acção governativa. Todos devem olhar não tanto para o que os nossos parceiros europeus fizeram, mas antes para o modo como o fizeram. As experiências de sucesso na Europa ensinam uma coisa: ou há soluções negociadas e partilhadas ou dificilmente haverá solução. O que também é válido para as relações laborais.
publicado no Diário Económico
Provavelmente para que a economia portuguesa tenha futuro, há que aprender com todas as soluções, mas com sensibilidade à especificidade nacional. As importações acríticas vêm sempre acompanhadas de uma propensão para a engenharia social. Ambas são invariavelmente más conselheiras.
Mas uma coisa é copiar políticas, esquecendo as tradições institucionais existentes no nosso país e os equilíbrios muito sensíveis em que assenta a economia portuguesa e consequentemente o nosso tecido social. Outra é aprender com os processos políticos que permitiram a alguns países europeus ultrapassar os bloqueios que enfrentaram no passado.
Se o caminho irlandês, dinamarquês, holandês e finlandês (e aqui a excepção é o Reino Unido) tem algo em comum, é o facto de as reformas terem assentado em processos negociados e em opções partilhadas por Governos e parceiros sociais, sob a forma de pactos sociais.
Apesar de já ter sido assinada uma mão-cheia de pactos sociais em Portugal, a verdade é que temos uma tradição muito fraca de negociação tripartida. Entre nós, quando Governo, patrões e sindicatos negoceiam, fazem-no defendendo intransigentemente a sua posição de partida. Quando os pactos são finalmente celebrados, ou reflectem a posição de parte dos interessados ou têm um alcance muito limitado.
Um pacto social eficaz requer partilha de vulnerabilidades e disponibilidade para alcançar soluções, nas quais todas as partes se afastem das posições de partida. Desse ponto de vista, o ”acordo de médio alcance” celebrado a semana passada sobre o subsídio de desemprego representa um passo em frente. Mas um passo circunscrito, ainda que a uma matéria muito relevante.
Com o ”livro verde sobre as relações laborais” apresentado hoje, abre-se uma nova janela de responsabilidade para Governo e parceiros sociais. Nenhuma das partes negará que a regulação do mercado de trabalho apresenta entre nós uma série de problemas (por ex., rigidez formal com flexibilidade de facto, que nos coloca no pior dos dois mundos; negociação colectiva conservadora e excessivamente centrada nas questões salariais e de tempo de trabalho; ou incapacidade de promover a inovação no mundo laboral). Neste sentido, o livro verde pode funcionar, antes de mais, como um importante instrumento de partilha de informação. Não menos importante, pode ajudar a colocar fim a algumas ideias sistematicamente repetidas, sem que sejam sujeitas a teste empírico e nas quais assenta muita da rigidez negocial das partes. A partilha de informação é mais importante do que aquilo que pode aparentar.
O que Governo e parceiros sociais têm à frente não é mais uma oportunidade para ajudar a desbloquear a economia portuguesa. É uma responsabilidade. Agora importa que saibam abandonar os papéis que se habituaram teimosamente a assumir: patrões devem esquecer a sua agenda frequentemente míope e com pouca capacidade de inovação; sindicatos devem abandonar a combinação de conservadorismo com irrealismo com que partem para a negociação; e Governo deve continuar nesta área a ter uma posição de abertura negocial - aliás contrastante com o voluntarismo unilateral que tem caracterizado muita da acção governativa. Todos devem olhar não tanto para o que os nossos parceiros europeus fizeram, mas antes para o modo como o fizeram. As experiências de sucesso na Europa ensinam uma coisa: ou há soluções negociadas e partilhadas ou dificilmente haverá solução. O que também é válido para as relações laborais.
publicado no Diário Económico
<< Home