Filhos? ... difícil é mantê-los.
A menos de dois meses das eleições e quando as vozes que afirmam que a sociedade portuguesa se encontra bloqueada são quase hegemónicas – muito por força da debilidade do nosso modelo produtivo, das baixas qualificações dos activos e ainda, naquilo que tem sido o factor mais apontado, pelo desequilíbrio das contas públicas – é boa altura para contrariar este fatalismo, identificando áreas onde as políticas públicas podem fazer a diferença. A política de família não é apenas uma dessas áreas, como é decisiva para a capacidade do país continuar a produzir riqueza.
A baixa taxa de fertilidade é, hoje, um dos problemas mais agudos que enfrentam as sociedades europeias. Em Portugal esta situação assume contornos particularmente preocupantes, tendo o país passado, num curto espaço de tempo, de uma das taxas mais elevadas da União Europeia, para valores inferiores à média. Este fenómeno tem consequências negativas, ao abalar as fundações em que assenta o nosso modelo de bem-estar. Embora, as causas que o originam sejam, em si mesmas, claramente positivas: o aumento dos níveis de escolaridade e consequente adiamento da entrada no mercado de trabalho; aumento exponencial da participação feminina no mercado de trabalho; ambições profissionais crescentes e a alteração dos costumes e da sexualidade.
Contudo, estes factores têm questionado o modelo de família em que assenta, tradicionalmente, a produção de bem-estar. O novo contexto em que vivemos, foi responsável, entre outras consequências, pela baixa da taxa de fertilidade, colocando em risco a capacidade futura do país em criar riqueza e reduzindo a sustentabilidade financeira dos esquemas de protecção social.
Responder a esta situação implica repensar a política de família. A questão não é, nem pode ser, voltar de forma anacrónica ao modelo de família do passado, mas, sim, criar condições para que a constituição de família não seja um obstáculo à participação no mercado de trabalho. Não podemos ter um mercado de trabalho que promove, cada vez mais, a flexibilidade e a mobilidade (regional e de empregos) e um modelo de família que bloqueie essa dinâmica. Se continuarmos por esse caminho, o resultado será necessariamente a perpetuação de um trade-off em que a família tem saído perdedora.
Uma política de família activa não deve ter como objectivo a promoção de um modelo de família particular. Pelo contrário, deve promover o aumento da taxa de fertilidade e possibilitar a constituição de famílias compatíveis com as exigências do mercado de trabalho, nomeadamente com a participação crescente das mulheres, sobre quem continua a recair de forma desproporcional o ónus do bem-estar familiar.
Uma esquerda moderna deve fazer da política de família um eixo central e prioritário da sua acção. Uma política de família virada para o futuro e desprovida de retórica ideológica passadista. É que numa altura em que as sociedades modernas – e a portuguesa em particular – geram dinâmicas que prejudicam a possibilidade de se ter filhos, cabe ao Estado contrariar essas mesmas dinâmicas, com políticas que apostem no futuro e que conciliem o bem-estar material das famílias com a possibilidade destas terem filhos.
O país tem de equilibrar as suas contas públicas e de desenvolver novas políticas para a competitividade, mas precisa, com igual intensidade, de uma política que faça da família um eixo central do seu modelo de bem-estar. O nosso futuro depende tanto desta dimensão das políticas públicas como das restantes.
O próximo governo deveria voltar a preocupar-se com o leque e a qualidade das respostas de apoio às famílias que querem ter filhos e, simultaneamente, criar mais incentivos à possibilidade de os ter. Designadamente, fazendo com que as escolas assumam o seu papel de apoio às famílias, evoluindo de escolas que se ocupam das aulas, para escolas que se ocupam das crianças – por ex. alargando o tempo de permanência das crianças na escola em actividades extra-curriculares; voltando a desenvolver as respostas para a primeira infância e o pré-escolar; tornando o mercado de trabalho amigável para a vida familiar, com horários mais flexíveis e promovendo o part-time, sem diminuição de direitos; incentivando o exercício efectivo dos direitos já existentes em termos de licenças parentais, para as mães, mas, também, para os pais; e alterando o sistema fiscal para que acomode diferentes modelos de estrutura familiar e para que incentive, de forma mais intensa, o aumento da taxa de fertilidade.
Uma política de família activa não é, nem pode ser, uma política dirigida a um modelo anacrónico de família. Tem de ser uma política que promova efectivamente a possibilidade de se ter filhos, mas que não colida com a participação dos pais no mercado de trabalho. O país precisa que todos façamos mais filhos, o desafio é fazer com que seja mais fácil às famílias mantê-los.
publicado em A Capital
A baixa taxa de fertilidade é, hoje, um dos problemas mais agudos que enfrentam as sociedades europeias. Em Portugal esta situação assume contornos particularmente preocupantes, tendo o país passado, num curto espaço de tempo, de uma das taxas mais elevadas da União Europeia, para valores inferiores à média. Este fenómeno tem consequências negativas, ao abalar as fundações em que assenta o nosso modelo de bem-estar. Embora, as causas que o originam sejam, em si mesmas, claramente positivas: o aumento dos níveis de escolaridade e consequente adiamento da entrada no mercado de trabalho; aumento exponencial da participação feminina no mercado de trabalho; ambições profissionais crescentes e a alteração dos costumes e da sexualidade.
Contudo, estes factores têm questionado o modelo de família em que assenta, tradicionalmente, a produção de bem-estar. O novo contexto em que vivemos, foi responsável, entre outras consequências, pela baixa da taxa de fertilidade, colocando em risco a capacidade futura do país em criar riqueza e reduzindo a sustentabilidade financeira dos esquemas de protecção social.
Responder a esta situação implica repensar a política de família. A questão não é, nem pode ser, voltar de forma anacrónica ao modelo de família do passado, mas, sim, criar condições para que a constituição de família não seja um obstáculo à participação no mercado de trabalho. Não podemos ter um mercado de trabalho que promove, cada vez mais, a flexibilidade e a mobilidade (regional e de empregos) e um modelo de família que bloqueie essa dinâmica. Se continuarmos por esse caminho, o resultado será necessariamente a perpetuação de um trade-off em que a família tem saído perdedora.
Uma política de família activa não deve ter como objectivo a promoção de um modelo de família particular. Pelo contrário, deve promover o aumento da taxa de fertilidade e possibilitar a constituição de famílias compatíveis com as exigências do mercado de trabalho, nomeadamente com a participação crescente das mulheres, sobre quem continua a recair de forma desproporcional o ónus do bem-estar familiar.
Uma esquerda moderna deve fazer da política de família um eixo central e prioritário da sua acção. Uma política de família virada para o futuro e desprovida de retórica ideológica passadista. É que numa altura em que as sociedades modernas – e a portuguesa em particular – geram dinâmicas que prejudicam a possibilidade de se ter filhos, cabe ao Estado contrariar essas mesmas dinâmicas, com políticas que apostem no futuro e que conciliem o bem-estar material das famílias com a possibilidade destas terem filhos.
O país tem de equilibrar as suas contas públicas e de desenvolver novas políticas para a competitividade, mas precisa, com igual intensidade, de uma política que faça da família um eixo central do seu modelo de bem-estar. O nosso futuro depende tanto desta dimensão das políticas públicas como das restantes.
O próximo governo deveria voltar a preocupar-se com o leque e a qualidade das respostas de apoio às famílias que querem ter filhos e, simultaneamente, criar mais incentivos à possibilidade de os ter. Designadamente, fazendo com que as escolas assumam o seu papel de apoio às famílias, evoluindo de escolas que se ocupam das aulas, para escolas que se ocupam das crianças – por ex. alargando o tempo de permanência das crianças na escola em actividades extra-curriculares; voltando a desenvolver as respostas para a primeira infância e o pré-escolar; tornando o mercado de trabalho amigável para a vida familiar, com horários mais flexíveis e promovendo o part-time, sem diminuição de direitos; incentivando o exercício efectivo dos direitos já existentes em termos de licenças parentais, para as mães, mas, também, para os pais; e alterando o sistema fiscal para que acomode diferentes modelos de estrutura familiar e para que incentive, de forma mais intensa, o aumento da taxa de fertilidade.
Uma política de família activa não é, nem pode ser, uma política dirigida a um modelo anacrónico de família. Tem de ser uma política que promova efectivamente a possibilidade de se ter filhos, mas que não colida com a participação dos pais no mercado de trabalho. O país precisa que todos façamos mais filhos, o desafio é fazer com que seja mais fácil às famílias mantê-los.
publicado em A Capital
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