quarta-feira, novembro 10, 2004

Apoiará Cavaco o PSD?

As eleições presidenciais estarão omnipresentes durante o Congresso do PSD do próximo fim de semana. Não importa que, contrariando os timings definidos quando era candidato a candidato, Santana Lopes tenha remetido na sua moção o tema para o final do primeiro semestre de 2005. Pode a direcção do PSD tentar assobiar para o lado e procurar fazer do congresso um momento de catarse colectiva, de união em torno do líder para dar um novo fôlego ao governo. Pode tentar tudo isso, mas, por mais que o faça, as presidenciais e o Dr. Cavaco vão estar sempre à espreita. É que se a prioridade do PSD é ganhar as próximas legislativas, neste percurso, as eleições mais relevantes, por serem as mais complicadas, são precisamente as presidenciais.
Com as sondagens a dar uma ajuda preciosa, Cavaco aparece sistematicamente como o candidato preferencial da direita. Contudo, e enquanto os cavaquistas lançam livros sobre o professor e preparam o terreno, a questão mais relevante não é saber se o PSD apoia a candidatura de Cavaco, mas, sim, se o candidato Cavaco apoiará este governo PSD/PP. Até porque, verdade seja dita, o PSD, uma vez lançada a candidatura do ex-primeiro-ministro, ver-se-á sempre, com maior ou menor entusiasmo, obrigado a apoiá-la. O problema está, por isso, em saber o que fará Cavaco com o apoio da coligação governamental
Neste contexto, a candidatura de Cavaco enfrenta um dilema: ou se distancia do governo e aumenta as suas possibilidades de vitória ou posiciona-se do lado da actual coligação e perde. Acontece que a primeira opção não é fácil nem para o candidato, nem muito menos para os partidos que eventualmente o venham a apoiar.
Na verdade, o distanciamento face ao Governo pode revelar-se para Cavaco uma estratégia à partida atraente. Contudo, a atracção inicial acarretará posteriormente complicações. Se se posicionar ao lado do governo pagará o preço da baixa popularidade deste, se se distanciar da coligação ficará sem estrutura no terreno e sem o apoio mobilizado de quem hoje manda nos partidos de direita. É que é muitas das vezes esquecido que sem uma máquina partidária bem oleada, dificilmente se realizam campanhas eleitorais vitoriosas em Portugal. Ora Cavaco precisa do apoio da “máquina” do PSD, mas, ao mesmo tempo, terá de se distanciar desse apoio. Nessa altura, o “aparelho” fará contas à vida e procurará perceber se prefere apoiar Cavaco e com isso ajudar a uma inevitável amplificação das críticas ao Governo ou, pelo contrário, apostar numa candidatura à partida perdedora mas que garanta a solidariedade com a coligação.
Na hora da verdade, o que estará em causa para o PSD, e também para o PP, é saber se prefere ter a hipótese de ter um Presidente ou, em alternativa, passados poucos meses, almejar ganhar as legislativas. Com este PSD e com Cavaco candidato, os dois objectivos dificilmente serão alcançados.
A escolha, que o Congresso do PSD não debaterá, mas estará omnipresente, é, por isso, entre criar as hipóteses para que um seu militante, mas a quem o partido já nada diz, esteja em Belém ou, em alternativa, permitir que o PSD tenha melhores condições para disputar as próximas legislativas e para que consequentemente, em caso de vitória, possa distribuir o poder por milhares de militantes.
Ao contrário da escolha do Governo, a eleição do Presidente da República serve ao eleito, mas de pouco ou nada serve a quem o elegeu e muito menos às máquinas partidárias que o carregam aos ombros. O Dr. Santana sabe bem disso e tudo fará para que o candidato do PSD não seja Cavaco. O seu futuro como primeiro-ministro depende em larga medida da capacidade de encontrar outro candidato presidencial, um candidato solidário com o seu governo, mesmo que esteja à partida derrotado. Resta saber se há alguém disponível para se sacrificar pelos Drs. Santana e Portas. Cavaco não o fará certamente.

P.S.
Os problemas da primeira Comissão Barroso resultaram, em larga medida, de uma coisa singela: a transferência para Bruxelas da patetice típica da vida política italiana. O que o Senhor Buttiglione fez foi apenas dar à Europa um exemplo do que é, no dia a dia, a actividade política em Itália. Com a segunda Comissão Barroso este problema parece ter ficado resolvido. Do Senhor Frattini, político mais experimentado e menos tonto, não se esperarão os mesmos dislates. No entanto, há algo de muito grave que permanece: a atribuição a um membro do Governo Berlusconi do pelouro da Justiça e Assuntos Internos. Se há área política em que a Europa não precisava da contribuição do Senhor Berlusconi era precisamente esta. Ao mesmo tempo que, com esta escolha, a Comissão fica sob a suspeita de não querer desenvolver mecanismos judiciais europeus que se podem tornar particularmente incómodos para o Cavalieri. Com tantos pelouros, qual a razão para ser exactamente este o atribuído a Itália? Só a retribuição do apoio dado por Berlusconi a Barroso o pode explicar. Há amizades que saem caras.
publicado em A Capital, 10 de Novembro