As tentações do PS
Há um conjunto de inevitabilidades no horizonte. Quando os anúncios cândidos do ministro das Finanças se concretizarem, o descontentamento aumentará. Pelo caminho, a coesão interna da coligação sofrerá abalos significativos. Ainda assim, a impopularidade de Passos Coelho pode não se traduzir em ganhos de popularidade para Seguro. Os socialistas enfrentam problemas conjunturais e estruturais que dificultam a sua afirmação política, o que os obriga a resistir a várias tentações contraproducentes.
Uma primeira tentação traz problemas no médio prazo. A combinação de voluntarismo ideológico com a convicção de que a austeridade pode ser expansionista tem empurrado o governo para além da troika. Este contexto cria uma oportunidade: o PS tornar-se no guardião do memorando de entendimento. É evidente que os socialistas não podem, agora, estar na oposição como se não tivessem estado no poder, mas, também, não podem cavar uma trincheira em torno da defesa das propostas da troika. O exercício é difícil, mas seria um erro manter uma atitude defensiva, abdicando da iniciativa, ainda para mais em torno de opções programáticas que violentam o património programático do centro-esquerda.
Ter vida para além da troika implica que o PS recupere a inclinação reformista e não ceda ao conservadorismo da defesa do status quo ou, pior, que descambe para a mitificação de um passado inexistente (seja no Serviço Nacional de Saúde ou na regulação do mercado de trabalho). Não se deve contrapor à narrativa liberal que Passos Coelho utilizou, uma outra, com as mesmas características formais. O mais certo seria essa tentação descambar no mesmo exercício pueril em que resultou o liberalismo de blogosfera do primeiro-ministro.
Desde logo, é necessário saber resistir aos temas populares (à cabeça, a demagogia em torno do combate à corrupção, que empurrará os partidos para um beco sem saída), mas, também, aos que têm a ver com o sistema político (das leis eleitorais ao voto dos deputados, passando pela obsessão rotativista com nomeações de boys). Centrar a iniciativa nos temas económicos e sociais é exigente e implica romper com o vício da politiquice, uma herança do processo formativo nas juventudes partidárias.
A este nível, antes das soluções, são necessárias prioridades. Quando se assiste a uma reconfiguração do Estado Social, substituindo-o por um conjunto de respostas de mínimos que asfixiam as classes médias baixas, a diferenciação não pode passar pela “sensibilidade social”, mas, sim, por procurar combinar sustentabilidade financeira com equidade e universalismo. Todas as propostas dos socialistas deveriam passar por este crivo.
Finalmente, mais do que enveredar pela auto-crítica em relação ao passado, assente em traços da personalidade de Sócrates ou no tipo de exercício do poder interno ao PS, é fundamental que se rompa com a língua de pau na política europeia. O socialismo democrático encontra-se hoje em maus lençóis também porque quando teve maioria política na Europa falhou.
publicado no Expresso de 10 de Setembro.
Uma primeira tentação traz problemas no médio prazo. A combinação de voluntarismo ideológico com a convicção de que a austeridade pode ser expansionista tem empurrado o governo para além da troika. Este contexto cria uma oportunidade: o PS tornar-se no guardião do memorando de entendimento. É evidente que os socialistas não podem, agora, estar na oposição como se não tivessem estado no poder, mas, também, não podem cavar uma trincheira em torno da defesa das propostas da troika. O exercício é difícil, mas seria um erro manter uma atitude defensiva, abdicando da iniciativa, ainda para mais em torno de opções programáticas que violentam o património programático do centro-esquerda.
Ter vida para além da troika implica que o PS recupere a inclinação reformista e não ceda ao conservadorismo da defesa do status quo ou, pior, que descambe para a mitificação de um passado inexistente (seja no Serviço Nacional de Saúde ou na regulação do mercado de trabalho). Não se deve contrapor à narrativa liberal que Passos Coelho utilizou, uma outra, com as mesmas características formais. O mais certo seria essa tentação descambar no mesmo exercício pueril em que resultou o liberalismo de blogosfera do primeiro-ministro.
Desde logo, é necessário saber resistir aos temas populares (à cabeça, a demagogia em torno do combate à corrupção, que empurrará os partidos para um beco sem saída), mas, também, aos que têm a ver com o sistema político (das leis eleitorais ao voto dos deputados, passando pela obsessão rotativista com nomeações de boys). Centrar a iniciativa nos temas económicos e sociais é exigente e implica romper com o vício da politiquice, uma herança do processo formativo nas juventudes partidárias.
A este nível, antes das soluções, são necessárias prioridades. Quando se assiste a uma reconfiguração do Estado Social, substituindo-o por um conjunto de respostas de mínimos que asfixiam as classes médias baixas, a diferenciação não pode passar pela “sensibilidade social”, mas, sim, por procurar combinar sustentabilidade financeira com equidade e universalismo. Todas as propostas dos socialistas deveriam passar por este crivo.
Finalmente, mais do que enveredar pela auto-crítica em relação ao passado, assente em traços da personalidade de Sócrates ou no tipo de exercício do poder interno ao PS, é fundamental que se rompa com a língua de pau na política europeia. O socialismo democrático encontra-se hoje em maus lençóis também porque quando teve maioria política na Europa falhou.
publicado no Expresso de 10 de Setembro.
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