sábado, janeiro 24, 2009

Um pobre serviço

Numa das passagens do discurso de tomada de posse, Barack Obama afirmou que os EUA continuam a ser a nação mais próspera e mais poderosa do mundo, com os trabalhadores mais produtivos e as mentes mais inventivas.

A crise não terá alterado nenhuma destas características, pelo que a capacidade norte-americana não se encontra diminuída.

A passagem, soube-se depois, tinha reminiscências assumidas de uma citação de Keynes. Com uma diferença, assinalada por Paul Krugman: enquanto Obama sugere que a depressão que as economias vivem resulta de um falhanço da vontade, Keynes, na citação inspiradora, via na crise dos anos 30 uma incompreensão dos mecanismos que a tinham provocado. A diferença sugere que para Obama a crise é causada por ausência de vontade política, já para Keynes ela era fruto de um falhanço das ideias.

Não vale a pena secundarizar o poder transformador da vontade. É essa a lição de Obama, cuja importância os cínicos se têm apressado a diminuir. Mas, ensina-nos a história, todos os grandes falhanços devem obrigar-nos a pensar e a crise que enfrentamos é um falhanço colossal da ideia de economias de mercado auto-reguladas.

Esta não é mais uma pequena crise cíclica, que um conjunto de pequenos ajustamentos possa resolver através dos mecanismos tradicionais (do investimento público à diminuição das taxas de juro). A crise revelou a incapacidade dos mercados para se autocorrigirem (uma premissa em que assentava a sua eficiência), ao mesmo tempo que serviu para expor o carácter opaco dos mecanismos de regulação do sistema financeiro. Será possível ultrapassar esta tempestade apenas com vontade?

Não. Precisamos também de novas ideias para resgatar o capitalismo global. Como chama a atenção Robert Skidelsky no último número da Prospect, esta crise assenta também num falhanço intelectual. E uma das ideias que falhou é o papel atribuído às agências de ‘rating', como a Standard & Poor's.

As agências de ‘rating' têm particulares responsabilidades na situação de calamidade em que se encontra hoje a economia mundial. Foram estas agências que ao longo dos últimos anos foram avaliando positivamente os activos que se vieram a revelar tóxicos. Paradoxalmente, são agora essas mesmas agências que, ao cortar os ‘ratings' (como aconteceu no caso português), tornam mais caro o recurso dos Estados ao crédito, que é necessário para resolver o problema que elas ajudaram a criar.

Estamos perante um problema que não se resolve com vontade. Precisa antes de novas ideias. Uma delas, como tem sido sugerido por vários economistas, pode passar por pura e simplesmente pôr fim ao papel das agências de ‘rating', hoje descredibilizadas, substituindo-as por uma entidade global, transparente, sujeita à sindicância democrática e, muito relevante, concentrada na defesa do bem bem comum.

publicado no Semanário Económico.