As aventuras de Pedro no Facebook
O
Facebook aparenta ser a concretização do sonho perfeito de todos os políticos.
Finalmente, uma ferramenta que permite falar sem intermediação. Séculos e
séculos de debate político mediado e eis que surge um meio que torna possível
fazer chegar a mensagem diretamente a milhões de seguidores. Mas o Facebook é,
também, para um líder político que ocupa cargos institucionais, como já deveria
ter aprendido Passos Coelho, uma máquina de criar ilusões, com efeitos
perversos.
Quando o
primeiro-ministro deixa de o ser, para assinar mensagens dirigidas aos
portugueses enquanto Pedro, está a alimentar uma ilusão de proximidade. Em tom
coloquial e numa linguagem “tu cá, tu lá”, Passos Coelho busca compensar a
distância que o separa de todos nós, que não somos governantes, nem estamos
imbuídos de nenhum poder formal. Mas os resultados não são os desejados:
banaliza a figura de primeiro-ministro e perde gravitas. Esta desinstitucionalização do chefe do executivo tem uma
consequência imediata. O primeiro-ministro passa a ser o Pedro e os portugueses
sentem-se à vontade para tratá-lo como tal. Passos Coelho não se dá ao
respeito, logo deixa de ser respeitado.
É
evidente que o poder não deve ser sacralizado porque sim. Pelo contrário.
Aliás, em democracia, é fundamental que o poder, e o poder político em
particular, seja exercido com modéstia e sejam preservados os seus limites. Num
contexto de crise como aquele que vivemos, este esforço é ainda mais
importante. Mas uma coisa é o recato no exercício do poder, outra é a
dessacralização das instituições do regime, combinada com exposição da vida
privada de quem nos governa, enredada numa linguagem moralista de pacotilha.
Estamos perante a receita perfeita para dar uma machada na pouca dignidade que
sobra aos cargos institucionais, ao mesmo tempo que se exponencia o
ressentimento social e político.
Mas não
menos relevante é a ilusão de participação que é criada nos seguidores do
Facebook. A sensação de proximidade funciona, de facto, nos dois sentidos.
Também quem recebe a mensagem julga estar próximo do emissor. Não por acaso,
assim que o Pedro publicou a mensagem de Natal, onde nos deixava também os
cumprimentos da Laura, os comentários dos leitores multiplicaram-se a uma
velocidade estonteante. De repente, os portugueses encontraram um espaço para
direcionar o seu descontentamento, canalizando a raiva para uma caixa de
comentários. Ora também aqui estamos perante uma ilusão, a de que a
participação desorganizada e não orgânica produz efeito. Não produz,
limitamo-nos a ver canalizada a violência verbal para uma caixa de comentários.
No fim,
resta a mensagem propriamente dita. Basta lê-la para ficarmos com a suspeição que
o estilo e o conteúdo têm a impressão digital de Passos Coelho. Não há, quanto
a isso, grandes pretextos para análise – trata-se de uma mensagem que
infelizmente fala por si.
publicado no Expresso de 29 de Dezembro
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