Necessidade, oportunidade e risco
A
decisão do PS de apresentar uma moção de censura é um espelho dos dilemas que
enfrentam os socialistas. O PS podia não apresentar uma moção de censura? Não,
não podia. O PS corre riscos ao apresentar uma moção de censura? Sim e pode
mesmo encaminhar-se para um beco político.
A
apresentação de uma moção de censura é, antes de mais, uma necessidade. Não
apenas porque estamos confrontados com um governo totalmente desorientado,
acossado por uma execução orçamental negativa, por um desemprego imparável e
pela incapacidade de cumprir os objectivos que traçou para si próprio (à
cabeça, os cortes de quatro mil milhões de euros), mas, também, porque o PS não
pode deixar de corporizar o descontentamento social que se sente na sociedade
portuguesa, sob pena de se tornar irremediavelmente irrelevante.
Mas
trata-se também de uma oportunidade. Tendo em conta que se antecipa que o
Tribunal Constitucional declarará inconstitucionais um conjunto de normas do
orçamento, o que obrigará o Governo a um esforço adicional de cortes já neste
ano, e que há claros indícios de que o primeiro-ministro pode bem procurar
fazer do acórdão o álibi de que necessita para justificar a sua própria
incapacidade política, é natural que o PS queira, ao mesmo tempo, antecipar-se e
liderar uma crise política que se agudizará rapidamente. O raciocínio é claro:
à estocada quase letal que será um orçamento de novo declarado
inconstitucional, juntar-se-á uma inédita moção de censura do PS, que procurará
ser a estocada final.
Contudo, os problemas que resultam
da apresentação de uma moção de censura pelos socialistas não são poucos.
Desde logo, o PS é um partido de
governo e não um partido de protesto, que apresenta moções de censura todas as
sessões legislativas. Não por acaso, cumprem-se agora dez anos desde a
apresentação da última, que teve como pretexto uma ruptura política sem
paralelo na história da democracia portuguesa – a opção do Governo Barroso de
apoiar a invasão do Iraque. É evidente que estamos perante uma situação
dramática e que requer uma ruptura política. No entanto, o PS só pode
apresentar uma moção de censura se tiver uma alternativa política e
programática para apresentar e, não menos importante, se for percepcionado
pelos portugueses como sendo uma alternativa. Ora, nenhuma destas condições
está reunida.
Politicamente, ou o PS tem uma
maioria absoluta (cenário que parece ser inviável) ou, mantendo-se um partido
incoligável, não oferece nenhuma solução governativa estável e,
programaticamente, enquanto não colocar em cima da mesa a renegociação da
dívida e a discussão dos termos da nossa participação no euro, não terá
possibilidade de formar um programa de governo alternativo.
É por isso que esta moção de
censura, sendo uma necessidade, não só demonstra as dificuldades que o PS enfrenta
como, mais relevante, revela o impasse político para o qual nos dirigimos – aliás,
a um ritmo imparável.
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