Faça-se ao lado
O super-ministro da Economia era um acidente à espera de acontecer. Em todo o caso, não resulta claro se a orgânica governamental que Passos Coelho resolveu experimentar, e que catapultou Santos Pereira para um ministério 4 em 1, foi fruto do populismo, da inexperiência ou de uma obsessão ideológica. O mais provável é ter sido um pouco das três coisas.
A opção por um megaministério da Economia é explicável pelo discurso populista que cavalga a ideia de que os nossos problemas são consequência de termos políticos a mais e governos grandes; pela chegada ao poder, no momento mais difícil da vida política portuguesa das últimas décadas, de um conjunto de pessoas, na sua larga maioria, demasiado impreparadas e com uma insólita inclinação para experimentalismos na orgânica do governo; e pela obsessão ideológica que, em nome do desmantelamento do Estado, não perde uma oportunidade para promover activamente a ineficiência das políticas públicas. Santos Pereira era o homem certo para dar vida a esta convergência de factores. Que tenha sido convidado e que tenha aceitado a missão, não espanta.
Mas, como a realidade tem muita força, os problemas não poderiam deixar de surgir e passou a ser necessário lidar com eles. E, neste aspecto, o primeiro-ministro não hesitou e, parafraseando-o, “recuperou velhos comportamentos preguiçosos”. Santos Pereira é incapaz de gerir as relações com os parceiros sociais? encontra-se um negociador fora do governo; Santos Pereira é incapaz de dar conta da internacionalização da economia? entrega-se a matéria aos Negócios Estrangeiros; Santos Pereira é incapaz de acompanhar as privatizações? convida-se uma figura de prestígio para acompanhar o processo; Santos Pereira é incapaz de responder ao flagelo do desemprego juvenil? forma-se uma comissão presidida por outro ministro; Santos Pereira é um empecilho para a execução dos fundos comunitários? institui-se uma “comissão chapéu”, coordenada por um colega de governo. No fundo, o primeiro-ministro optou pela solução simples. Santos Pereira não tem competências políticas? o Ministério é ingovernável? recorra-se ao velho: “faça-se ao lado”.
Perante este cenário, não há, como bem referiu Passos Coelho, desmantelamento dos ministérios. De facto, a orgânica do governo mantém-se inalterada – e, aliás, por concluir. Há, contudo, uma outra coisa, bem pior: do ponto de vista institucional, fica tudo na mesma, mas criam-se estruturas paralelas, escassamente formalizadas e menos sujeitas ao escrutínio político (desde logo do parlamento), para compensar a inoperância da estrutura orgânica existente. É um procedimento habitual no Estado português e que tem dado contributos bastante negativos para a implementação das políticas públicas. Aliás, pode bem dar-se o caso de estarmos como estamos, não por força de opções substantivas erradas dos sucessivos governos, mas como consequência de práticas institucionais contraproducentes. A história do Álvaro é, no fundo, mais um episódio de uma trajectória de degradação do Estado.
publicado no Expresso de 10 de Março
A opção por um megaministério da Economia é explicável pelo discurso populista que cavalga a ideia de que os nossos problemas são consequência de termos políticos a mais e governos grandes; pela chegada ao poder, no momento mais difícil da vida política portuguesa das últimas décadas, de um conjunto de pessoas, na sua larga maioria, demasiado impreparadas e com uma insólita inclinação para experimentalismos na orgânica do governo; e pela obsessão ideológica que, em nome do desmantelamento do Estado, não perde uma oportunidade para promover activamente a ineficiência das políticas públicas. Santos Pereira era o homem certo para dar vida a esta convergência de factores. Que tenha sido convidado e que tenha aceitado a missão, não espanta.
Mas, como a realidade tem muita força, os problemas não poderiam deixar de surgir e passou a ser necessário lidar com eles. E, neste aspecto, o primeiro-ministro não hesitou e, parafraseando-o, “recuperou velhos comportamentos preguiçosos”. Santos Pereira é incapaz de gerir as relações com os parceiros sociais? encontra-se um negociador fora do governo; Santos Pereira é incapaz de dar conta da internacionalização da economia? entrega-se a matéria aos Negócios Estrangeiros; Santos Pereira é incapaz de acompanhar as privatizações? convida-se uma figura de prestígio para acompanhar o processo; Santos Pereira é incapaz de responder ao flagelo do desemprego juvenil? forma-se uma comissão presidida por outro ministro; Santos Pereira é um empecilho para a execução dos fundos comunitários? institui-se uma “comissão chapéu”, coordenada por um colega de governo. No fundo, o primeiro-ministro optou pela solução simples. Santos Pereira não tem competências políticas? o Ministério é ingovernável? recorra-se ao velho: “faça-se ao lado”.
Perante este cenário, não há, como bem referiu Passos Coelho, desmantelamento dos ministérios. De facto, a orgânica do governo mantém-se inalterada – e, aliás, por concluir. Há, contudo, uma outra coisa, bem pior: do ponto de vista institucional, fica tudo na mesma, mas criam-se estruturas paralelas, escassamente formalizadas e menos sujeitas ao escrutínio político (desde logo do parlamento), para compensar a inoperância da estrutura orgânica existente. É um procedimento habitual no Estado português e que tem dado contributos bastante negativos para a implementação das políticas públicas. Aliás, pode bem dar-se o caso de estarmos como estamos, não por força de opções substantivas erradas dos sucessivos governos, mas como consequência de práticas institucionais contraproducentes. A história do Álvaro é, no fundo, mais um episódio de uma trajectória de degradação do Estado.
publicado no Expresso de 10 de Março
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