segunda-feira, junho 20, 2011

Um partido incoligável

O PS começou a perder as eleições no momento em que formou um governo minoritário em 2009. Após a magra vitória nas legislativas e perante a necessidade de fazer ajustamentos muito impopulares, governar em maioria relativa com acordos de curtíssimo alcance levaria inevitavelmente à derrocada eleitoral do último domingo. Poderia ter sido diferente? Muito provavelmente não, o que revela a encruzilhada em que se encontram os socialistas. Com a resiliência eleitoral da esquerda do pré-25 de Novembro, o PS dificilmente conquista uma maioria absoluta, ao mesmo tempo que é um partido incoligável: não pode realizar entendimentos programáticos à sua esquerda e fica dependente de acordos à direita que duram enquanto PSD e CDS os considerarem oportunos.
De facto, talvez o eleitorado seja mais racional do que muitas das vezes pensamos e tenha incorporado a percepção de que, em particular num contexto económico de enormes dificuldades, a estabilidade política é um valor inestimável. Ora, no domingo, a única solução política que oferecia estabilidade era a vitória dos partidos de direita. Hoje, mesmo que o PS seja um partido mais alinhado com as preferências programáticas dos portugueses do que o PSD de Passos Coelho, os socialistas encontram-se afastados do arco da governabilidade. Aliás, o PS só foi capaz de levar duas legislaturas até ao fim – num caso com a economia a viver um período de crescimento económico que não se antevê que se volte a repetir (com Guterres), noutro com uma maioria absoluta que resultou da forte rejeição do primeiro-ministro em exercício (a vitória de Sócrates contra Santana). Enquanto os portugueses tiverem presente a inviabilidade de governos minoritários, dificilmente o PS pode ambicionar regressar ao poder.
Não demorará muito tempo para que o PS se liberte da impopularidade de Sócrates e ainda menos tempo decorrerá até o novo Governo passar a ser penalizado pela degradação continuada da situação económica e social, mas o PS continuará a não ser capaz de oferecer estabilidade política.
Independentemente de quem for o próximo secretário-geral do PS, superar este bloqueio terá de ser uma tarefa central. Há, naturalmente, duas formas de o fazer. Encetar um caminho de diálogo à esquerda (um suicídio político enquanto os partidos da esquerda parlamentar se recusarem a fazer um aggiornamento programático) ou crescer eleitoralmente à esquerda (o que pela primeira vez pode acontecer de modo sustentável, após a PRDização do BE e as dificuldades que o PC encontrará para manter a sua base política nas próximas autárquicas).
No entanto, qualquer tipo de estratégia consequente para reaproximar o PS do arco da governabilidade depende de uma transformação programática da social-democracia europeia. Ou o centro-esquerda europeu é capaz de superar os bloqueios actuais, ou persistirá na trajectória de definhamento político em que se encontra. O drama é que, a este respeito, o papel de um partido português é marginal.
publicado no Expresso de 10 de Junho