O legado bolchevique
Morreu este fim-de-semana, aos 95 anos, Dias Lourenço, um dos últimos membros do núcleo duro que acompanhou Álvaro Cunhal nos “sete fôlegos” de que fala Carlos Brito nas suas recentes memórias (“Álvaro Cunhal, Os Sete Fôlegos de um Combatente”, Edições Nelson de Matos).
Dias Lourenço definia-se, com orgulho, como "um velho bolchevique". Pertenceu a uma geração de comunistas que conduziu a chamada reorganização do Partido, resistindo com coragem cívica e física à ditadura. A história da sua fuga de Peniche é, sem dúvida, épica. Depois do 25 de Abril e do PREC, este grupo soube responder de forma positiva ao desafio que Melo Antunes lhes lançou: a integração dos comunistas e das forças revolucionárias no sistema democrático.
Não conseguiram, no entanto, reagir com lucidez à implosão da URSS, por onde quase todos haviam estado nalgum momento da sua vida. A partir da década de 90, com o passar do tempo e após derrotas eleitorais sucessivas, esta geração deu lugar a outra que parecia preparada para conduzir a renovação necessária: Luís Sá, João Amaral, Edgar Correia, entre outros. Foi o tempo do "Novo Impulso", a última vez em que o PCP procurou seguir uma estratégia de alargamento do seu espaço cultural e eleitoral. Ao contrário do que a ortodoxia comunista e o comentário conservador querem fazer crer, não foi nos tempos de cristalização ideológica que o PCP cresceu. Nem está escrito em lado nenhum que só a reafirmação anacrónica do marxismo-leninismo é o antídoto para o definhamento dos partidos comunistas. Como lembra Carlos Brito, nas referidas memórias, foi a seguir à Perestroika e ao inacreditável apoio do PC aos golpistas de 1991 que a quebra eleitoral mais se acentuou. Com este posicionamento político, a fuga de quadros foi grande e a influência cultural de que o PC ainda beneficiava foi desaparecendo. Pelo contrário, em 1999, no auge do movimento do "Novo Impulso", que contou com o apoio inicial de Carlos Carvalhas, o PCP até teve um bom resultado.
O regresso à linha ortodoxa, representada por Jerónimo de Sousa e preparada na sombra pelos velhos (e novos) bolcheviques, só tem servido para resistir, tirando ao PCP qualquer hipótese de crescimento, mesmo em anos de governação socialista. Quem tem aproveitado é o Bloco de Esquerda. Ao contrário do que sugeria Carvalho da Silva numa entrevista ao Sol, não é tanto a falta de um PS social-democrata que tem impedido o diálogo entre a esquerda portuguesa. Como bem sabe o líder da CGTP, é justamente neste regresso do PCP à ortodoxia e na sua competição fratricida com o BE que tem residido o principal bloqueio do sistema partidário português.
publicado no Diário Económico.
Dias Lourenço definia-se, com orgulho, como "um velho bolchevique". Pertenceu a uma geração de comunistas que conduziu a chamada reorganização do Partido, resistindo com coragem cívica e física à ditadura. A história da sua fuga de Peniche é, sem dúvida, épica. Depois do 25 de Abril e do PREC, este grupo soube responder de forma positiva ao desafio que Melo Antunes lhes lançou: a integração dos comunistas e das forças revolucionárias no sistema democrático.
Não conseguiram, no entanto, reagir com lucidez à implosão da URSS, por onde quase todos haviam estado nalgum momento da sua vida. A partir da década de 90, com o passar do tempo e após derrotas eleitorais sucessivas, esta geração deu lugar a outra que parecia preparada para conduzir a renovação necessária: Luís Sá, João Amaral, Edgar Correia, entre outros. Foi o tempo do "Novo Impulso", a última vez em que o PCP procurou seguir uma estratégia de alargamento do seu espaço cultural e eleitoral. Ao contrário do que a ortodoxia comunista e o comentário conservador querem fazer crer, não foi nos tempos de cristalização ideológica que o PCP cresceu. Nem está escrito em lado nenhum que só a reafirmação anacrónica do marxismo-leninismo é o antídoto para o definhamento dos partidos comunistas. Como lembra Carlos Brito, nas referidas memórias, foi a seguir à Perestroika e ao inacreditável apoio do PC aos golpistas de 1991 que a quebra eleitoral mais se acentuou. Com este posicionamento político, a fuga de quadros foi grande e a influência cultural de que o PC ainda beneficiava foi desaparecendo. Pelo contrário, em 1999, no auge do movimento do "Novo Impulso", que contou com o apoio inicial de Carlos Carvalhas, o PCP até teve um bom resultado.
O regresso à linha ortodoxa, representada por Jerónimo de Sousa e preparada na sombra pelos velhos (e novos) bolcheviques, só tem servido para resistir, tirando ao PCP qualquer hipótese de crescimento, mesmo em anos de governação socialista. Quem tem aproveitado é o Bloco de Esquerda. Ao contrário do que sugeria Carvalho da Silva numa entrevista ao Sol, não é tanto a falta de um PS social-democrata que tem impedido o diálogo entre a esquerda portuguesa. Como bem sabe o líder da CGTP, é justamente neste regresso do PCP à ortodoxia e na sua competição fratricida com o BE que tem residido o principal bloqueio do sistema partidário português.
publicado no Diário Económico.
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