Como fazer?
Lido o programa do PSD, o que fica é um conjunto de vacuidades com as quais qualquer pessoa de bom senso tende a concordar.
Nas áreas duras das políticas públicas - educação, saúde, segurança social - encontramos omissões significativas combinadas com enunciados genéricos. É por isso que se em 38 páginas é possível vislumbrar a resposta à pergunta "que fazer?", raramente se encontram indícios que nos permitam responder ao bem mais exigente, "como fazer?".
Os parágrafos dedicados à segurança social são um bom retrato do programa. O PSD é claro quando sustenta "o progressivo plafonamento do valor das contribuições". No fundo, defende que se intensifique a evolução para um sistema de segurança social misto, que combine repartição - as contribuições de quem está hoje no mercado de trabalho pagam as pensões dos actuais beneficiários - com capitalização - as contribuições feitas hoje servem para financiar os benefícios futuros. Pese embora se queira frequentemente fazer crer que um sistema assente na capitalização é sinónimo de uma segurança social privada, tal não é verdade. Aliás, o sistema português tem desde a lei de bases de 2007 uma componente de capitalização, ainda que voluntária, e tem mesmo um fundo de estabilização financeiro que obtém óptimas rendibilidades com investimentos prudentes no mercado de capitais. Nenhuma destas soluções assenta numa lógica privatizadora: a gestão é pública. Para além da retórica política, ninguém duvida que há virtudes em sistemas assentes na repartição - ajudam a criar solidariedade intergeracional - bem como nos que se fundam na capitalização - potenciam a responsabilidade individual -, sendo que ambos os modelos podem assentar numa gestão pública.
Se fosse possível desenhar um regime de segurança social desde o zero, a escolha recairia sobre um sistema misto. O problema é que tal não é possível: há um legado institucional que, ao mesmo tempo que impossibilita que se desenhe um sistema como se não existissem opções anteriores, torna os custos de transição de tal modo elevados que qualquer mudança no sistema é financeiramente incomportável. Desde logo, porque para começar a capitalizar diminuir-se-ia automaticamente a receita, logo o sistema ficaria impossibilitado de assegurar as prestações dos actuais beneficiários. Que o PSD se proponha mudar a natureza do nosso regime, ainda para mais numa altura em que o mercado de trabalho se encontra deprimido, e não dedique uma linha a explicar como o pretende fazer não é um contributo sério para uma política de verdade. Sinceramente, não vejo como seja possível diminuir a taxa social única em dois pontos percentuais, tornar o subsídio de desemprego mais generoso e, ao mesmo tempo, fazer evoluir a segurança social para um sistema misto. Pensando bem há uma forma: ferindo de morte a sustentabilidade financeira da segurança social.
publicado no Diário Económico.
Nas áreas duras das políticas públicas - educação, saúde, segurança social - encontramos omissões significativas combinadas com enunciados genéricos. É por isso que se em 38 páginas é possível vislumbrar a resposta à pergunta "que fazer?", raramente se encontram indícios que nos permitam responder ao bem mais exigente, "como fazer?".
Os parágrafos dedicados à segurança social são um bom retrato do programa. O PSD é claro quando sustenta "o progressivo plafonamento do valor das contribuições". No fundo, defende que se intensifique a evolução para um sistema de segurança social misto, que combine repartição - as contribuições de quem está hoje no mercado de trabalho pagam as pensões dos actuais beneficiários - com capitalização - as contribuições feitas hoje servem para financiar os benefícios futuros. Pese embora se queira frequentemente fazer crer que um sistema assente na capitalização é sinónimo de uma segurança social privada, tal não é verdade. Aliás, o sistema português tem desde a lei de bases de 2007 uma componente de capitalização, ainda que voluntária, e tem mesmo um fundo de estabilização financeiro que obtém óptimas rendibilidades com investimentos prudentes no mercado de capitais. Nenhuma destas soluções assenta numa lógica privatizadora: a gestão é pública. Para além da retórica política, ninguém duvida que há virtudes em sistemas assentes na repartição - ajudam a criar solidariedade intergeracional - bem como nos que se fundam na capitalização - potenciam a responsabilidade individual -, sendo que ambos os modelos podem assentar numa gestão pública.
Se fosse possível desenhar um regime de segurança social desde o zero, a escolha recairia sobre um sistema misto. O problema é que tal não é possível: há um legado institucional que, ao mesmo tempo que impossibilita que se desenhe um sistema como se não existissem opções anteriores, torna os custos de transição de tal modo elevados que qualquer mudança no sistema é financeiramente incomportável. Desde logo, porque para começar a capitalizar diminuir-se-ia automaticamente a receita, logo o sistema ficaria impossibilitado de assegurar as prestações dos actuais beneficiários. Que o PSD se proponha mudar a natureza do nosso regime, ainda para mais numa altura em que o mercado de trabalho se encontra deprimido, e não dedique uma linha a explicar como o pretende fazer não é um contributo sério para uma política de verdade. Sinceramente, não vejo como seja possível diminuir a taxa social única em dois pontos percentuais, tornar o subsídio de desemprego mais generoso e, ao mesmo tempo, fazer evoluir a segurança social para um sistema misto. Pensando bem há uma forma: ferindo de morte a sustentabilidade financeira da segurança social.
publicado no Diário Económico.
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