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A notícia é do final da semana passada e a indiferença com que foi recebida é um sintoma grave da passividade reinante. Em comunicado, o gabinete do primeiro-ministro anunciou, deixando transpirar um tom de satisfação, a criação de um “grupo de apoio a Portugal” com vista a “assessorar o executivo português na agilização dos fundos comunitários”. No mesmo comunicado ficámos a saber que a equipa teria cinco pessoas em permanência em Lisboa a trabalhar junto do Ministério das Finanças e da Esame (a estrutura que acompanha a implementação do memorando), coordenadas desde Bruxelas.
No fundo, depois da perda de soberania com o memorando de entendimento, o governo acaba de assumir a falência técnico-administrativa do Estado. O que nos é dito é que há uma equipa de peritos estrangeiros que vem fazer agora o que fomos capazes de fazer durante décadas: programar, gerir e implementar fundos comunitários. Que isto seja requerido pelo governo e aceite silenciosamente por todos é revelador do pouco respeito que temos pela nossa própria soberania. Pelos vistos, a nossa administração pública perdeu as suas capacidades e ninguém o fez notar.
O caso parece-me demasiado grave para se circunscrever às suas implicações políticas imediatas. Mas, ainda assim, elas são evidentes.
Por um lado, ficam demonstrados os efeitos perversos de termos um governo pequeno. O ministro da Economia acumulou demasiadas responsabilidades e não foi capaz de dar conta do recado. Para além da economia, do emprego e das obras públicas, também tinha a competência de tutelar a gestão dos fundos comunitários. Perdeu-a e alienou-a parcialmente para uma entidade externa. Começamos a pagar os custos de uma orgânica governamental que não tinha racionalidade. Por outro lado, o próprio governo português assume a incapacidade do titular da Economia. Só assim se explica que o “grupo de apoio” vá trabalhar junto das finanças quando a tutela dos fundos comunitários é do ministro Santos Pereira. A mensagem política é clara: também para o Governo o ministro da Economia começou a deixar de existir.
Mas, o mais grave é o sinal que é dado sobre a degradação da administração pública. Nenhum estado soberano se construiu sem uma administração autónoma e eficaz. A ligeireza com que o governo recorre a este tipo de auxílio externo coloca-nos ao nível dos países que dependem da cooperação estrangeira para ultrapassar os seus bloqueios e insuficiências institucionais. O caso é inédito, Portugal não fazia parte desse grupo de países. Convenhamos, contudo, que tendo em conta que os cortes na despesa pública não assentam em nenhuma reforma estratégica do Estado, o resultado final só poderá ser uma degradação generalizada das competências da administração. Não faltará muito para que todo o interesse público passe a ser gerido, em regime de outsourcing, por “grupos de apoio”.
publicado no Expresso de 15 de Outubro
No fundo, depois da perda de soberania com o memorando de entendimento, o governo acaba de assumir a falência técnico-administrativa do Estado. O que nos é dito é que há uma equipa de peritos estrangeiros que vem fazer agora o que fomos capazes de fazer durante décadas: programar, gerir e implementar fundos comunitários. Que isto seja requerido pelo governo e aceite silenciosamente por todos é revelador do pouco respeito que temos pela nossa própria soberania. Pelos vistos, a nossa administração pública perdeu as suas capacidades e ninguém o fez notar.
O caso parece-me demasiado grave para se circunscrever às suas implicações políticas imediatas. Mas, ainda assim, elas são evidentes.
Por um lado, ficam demonstrados os efeitos perversos de termos um governo pequeno. O ministro da Economia acumulou demasiadas responsabilidades e não foi capaz de dar conta do recado. Para além da economia, do emprego e das obras públicas, também tinha a competência de tutelar a gestão dos fundos comunitários. Perdeu-a e alienou-a parcialmente para uma entidade externa. Começamos a pagar os custos de uma orgânica governamental que não tinha racionalidade. Por outro lado, o próprio governo português assume a incapacidade do titular da Economia. Só assim se explica que o “grupo de apoio” vá trabalhar junto das finanças quando a tutela dos fundos comunitários é do ministro Santos Pereira. A mensagem política é clara: também para o Governo o ministro da Economia começou a deixar de existir.
Mas, o mais grave é o sinal que é dado sobre a degradação da administração pública. Nenhum estado soberano se construiu sem uma administração autónoma e eficaz. A ligeireza com que o governo recorre a este tipo de auxílio externo coloca-nos ao nível dos países que dependem da cooperação estrangeira para ultrapassar os seus bloqueios e insuficiências institucionais. O caso é inédito, Portugal não fazia parte desse grupo de países. Convenhamos, contudo, que tendo em conta que os cortes na despesa pública não assentam em nenhuma reforma estratégica do Estado, o resultado final só poderá ser uma degradação generalizada das competências da administração. Não faltará muito para que todo o interesse público passe a ser gerido, em regime de outsourcing, por “grupos de apoio”.
publicado no Expresso de 15 de Outubro
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