Afundar o Estado
O papel estratégico do Estado precisa de ser repensado. É uma evidência que salta aos olhos de qualquer um – por força do défice de sustentabilidade financeira, por alterações profundas do contexto para o qual foram pensadas muitas das políticas públicas e, não menos importante, por existirem demasiados casos de péssima gestão, nomeadamente no sector empresarial do Estado. Mas uma coisa é contrariar o imobilismo dos que fingem que tudo vai bem, outra, bem diferente, é aproveitar o actual contexto para inviabilizar a reabilitação do Estado. Infelizmente, são demasiados os exemplos em que se evita repensar as funções do Estado, optando por deslegitimar a sua acção, fazendo com que ele não aja de boa fé. É um caminho soez para concretizar o projecto ideológico de um Estado mínimo. Há muitos exemplos deste tipo de actuação.
O mais conhecido e duradouro é o das dívidas a empresas privadas. Não se trata apenas de uma limitação à viabilidade económica de muitas empresas, mas, também, de um exemplo gritante de como o Estado, impunemente, não respeita os seus compromissos.
Mas, para provar que há sempre novas formas de degradar a imagem das políticas públicas junto dos cidadãos, este governo não perdeu tempo para confirmar que é um erro partir do pressuposto de que o Estado é pessoa de bem.
Estava previsto para o início do ano lectivo a entrega de prémios pecuniários para os melhores alunos do ano passado. É legítimo discutir a distribuição de dinheiro como forma de reconhecer mérito académico, pelo que a suspensão dos prémios poderia bem ser feita no próximo ano lectivo. O que já não é aceitável é que, apenas porque se mudou de ministro, se decida, nalguns casos a horas da entrega, retirar os prémios que estavam já destinados. A mensagem dada aos estudantes é clara: não confies no Estado, pois o que ele diz num dia não se importa de desdizer no dia seguinte.
Para recensear as fundações que existem – um trabalho de natureza administrativa necessário para pôr fim a excessos –, a maioria parlamentar não encontrou melhor solução do que aplicar uma medida preventiva que suspende todas as fundações, amalgamando situações muito diferentes e não separando o trigo do joio. As consequências são claras: a decisão, reveladora de um autoritarismo de Estado que em Portugal está sempre à espreita, suspende também preventivamente as três universidades que entretanto se haviam tornado fundações e casos de sucesso na gestão pública. Perante as boas práticas, o que o Estado oferece é incerteza e um quadro de paralisia institucional que se arrastará durante meses.
Podemos pensar que estes exemplos não passam de casos de incompetência, incúria legislativa ou apenas dislates causados pela cegueira política. No entanto, é possível que assim não seja. O mais provável é estarmos perante passos de uma estratégia mais ambiciosa e que visa afundar o Estado, inviabilizando a sua reforma.
publicado no Expresso de 8 de Outubro
O mais conhecido e duradouro é o das dívidas a empresas privadas. Não se trata apenas de uma limitação à viabilidade económica de muitas empresas, mas, também, de um exemplo gritante de como o Estado, impunemente, não respeita os seus compromissos.
Mas, para provar que há sempre novas formas de degradar a imagem das políticas públicas junto dos cidadãos, este governo não perdeu tempo para confirmar que é um erro partir do pressuposto de que o Estado é pessoa de bem.
Estava previsto para o início do ano lectivo a entrega de prémios pecuniários para os melhores alunos do ano passado. É legítimo discutir a distribuição de dinheiro como forma de reconhecer mérito académico, pelo que a suspensão dos prémios poderia bem ser feita no próximo ano lectivo. O que já não é aceitável é que, apenas porque se mudou de ministro, se decida, nalguns casos a horas da entrega, retirar os prémios que estavam já destinados. A mensagem dada aos estudantes é clara: não confies no Estado, pois o que ele diz num dia não se importa de desdizer no dia seguinte.
Para recensear as fundações que existem – um trabalho de natureza administrativa necessário para pôr fim a excessos –, a maioria parlamentar não encontrou melhor solução do que aplicar uma medida preventiva que suspende todas as fundações, amalgamando situações muito diferentes e não separando o trigo do joio. As consequências são claras: a decisão, reveladora de um autoritarismo de Estado que em Portugal está sempre à espreita, suspende também preventivamente as três universidades que entretanto se haviam tornado fundações e casos de sucesso na gestão pública. Perante as boas práticas, o que o Estado oferece é incerteza e um quadro de paralisia institucional que se arrastará durante meses.
Podemos pensar que estes exemplos não passam de casos de incompetência, incúria legislativa ou apenas dislates causados pela cegueira política. No entanto, é possível que assim não seja. O mais provável é estarmos perante passos de uma estratégia mais ambiciosa e que visa afundar o Estado, inviabilizando a sua reforma.
publicado no Expresso de 8 de Outubro
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