A força da realidade
José Sócrates aproveitou uma iniciativa do PS para responder ao discurso de Passos Coelho no Pontal. E o que “passou” foi isso mesmo: a resposta à revisão constitucional “neoliberal” do PSD e à recente disponibilidade do principal partido da oposição para abrir uma crise política.
Na aparência, os últimos tempos têm corrido bem a Sócrates. No caso da ‘golden share', Passos Coelho surgiu como antipatriótico; no projecto de revisão constitucional, apareceu como alguém que quer privatizar serviços públicos e facilitar despedimentos; finalmente, no Pontal, o líder do principal partido da oposição perdeu a imagem de responsabilidade manifestada no PEC II e admitiu chumbar o Orçamento e abrir uma crise política. O estado de graça de Passos é passado, sem dúvida. E realmente não se percebe o que levou o líder do PSD, que até estava a beneficiar da imagem de responsabilidade deixada na aprovação dos objectivos do PEC, a inventar sucessivas e desastrosas manobras de demarcação política.
As coisas têm-se passado de tal modo que já se começa instalar a ideia de que talvez ainda esteja para nascer o líder do PSD que vai derrotar José Sócrates. Confesso que acho algo ilusório este optimismo. Na verdade, as últimas sondagens continuam a dar vantagem ao PSD - à semelhança do que sucede em praticamente todos os países, onde os Governos têm sido muito penalizados pela crise.
No final, a revisão constitucional de Passos Coelho pesará sempre muito menos do que os números do desemprego. Com o desemprego nos 10% de pouco servirá acenar com o papão neo-liberal. A realidade tem sempre mais força do que as proclamações programáticas.
Mas, para além destes indicadores económicos e sociais que não costumam dar muita saúde política aos governos, provavelmente o maior sinal de alerta para o PS é a incapacidade que revela em marcar a agenda política. No discurso de Mangualde, Sócrates esforçou-se por lembrar a agenda do Governo. Infelizmente, e como já vem sendo hábito, dessa agenda pouco ficou na memória - e isto diz muito da capacidade de mobilização e liderança de que o Executivo goza nesta fase. Longe vão os tempos em que se discutia as políticas de educação de Maria de Lurdes Rodrigues, a reforma da segurança social de Vieira da Silva e as mudanças na saúde de Correia de Campos. E, nesta fase, era mais de iniciativas políticas do que de crises políticas que o país precisava.
Ao fim de perto de seis anos, termina aqui a minha colaboração com o Económico. Agradeço, primeiro, ao Martim Avillez, depois ao António Costa, o convite para escrever e, acima de tudo, a liberdade absoluta de que sempre gozei nestas páginas. O Ricardo da Costa Nunes e a Madalena Leal foram, ao longo destes anos, interlocutores atentos. Quem lê os jornais muitas das vezes desconhece os nomes daqueles que, na sombra, os fazem quotidianamente. Agradeço aos leitores as reacções que me foram enviando ao longo dos tempos. A partir de agora, manter-me-ei um fiel leitor do Económico.
publicado no Diário Económico.
Na aparência, os últimos tempos têm corrido bem a Sócrates. No caso da ‘golden share', Passos Coelho surgiu como antipatriótico; no projecto de revisão constitucional, apareceu como alguém que quer privatizar serviços públicos e facilitar despedimentos; finalmente, no Pontal, o líder do principal partido da oposição perdeu a imagem de responsabilidade manifestada no PEC II e admitiu chumbar o Orçamento e abrir uma crise política. O estado de graça de Passos é passado, sem dúvida. E realmente não se percebe o que levou o líder do PSD, que até estava a beneficiar da imagem de responsabilidade deixada na aprovação dos objectivos do PEC, a inventar sucessivas e desastrosas manobras de demarcação política.
As coisas têm-se passado de tal modo que já se começa instalar a ideia de que talvez ainda esteja para nascer o líder do PSD que vai derrotar José Sócrates. Confesso que acho algo ilusório este optimismo. Na verdade, as últimas sondagens continuam a dar vantagem ao PSD - à semelhança do que sucede em praticamente todos os países, onde os Governos têm sido muito penalizados pela crise.
No final, a revisão constitucional de Passos Coelho pesará sempre muito menos do que os números do desemprego. Com o desemprego nos 10% de pouco servirá acenar com o papão neo-liberal. A realidade tem sempre mais força do que as proclamações programáticas.
Mas, para além destes indicadores económicos e sociais que não costumam dar muita saúde política aos governos, provavelmente o maior sinal de alerta para o PS é a incapacidade que revela em marcar a agenda política. No discurso de Mangualde, Sócrates esforçou-se por lembrar a agenda do Governo. Infelizmente, e como já vem sendo hábito, dessa agenda pouco ficou na memória - e isto diz muito da capacidade de mobilização e liderança de que o Executivo goza nesta fase. Longe vão os tempos em que se discutia as políticas de educação de Maria de Lurdes Rodrigues, a reforma da segurança social de Vieira da Silva e as mudanças na saúde de Correia de Campos. E, nesta fase, era mais de iniciativas políticas do que de crises políticas que o país precisava.
Ao fim de perto de seis anos, termina aqui a minha colaboração com o Económico. Agradeço, primeiro, ao Martim Avillez, depois ao António Costa, o convite para escrever e, acima de tudo, a liberdade absoluta de que sempre gozei nestas páginas. O Ricardo da Costa Nunes e a Madalena Leal foram, ao longo destes anos, interlocutores atentos. Quem lê os jornais muitas das vezes desconhece os nomes daqueles que, na sombra, os fazem quotidianamente. Agradeço aos leitores as reacções que me foram enviando ao longo dos tempos. A partir de agora, manter-me-ei um fiel leitor do Económico.
publicado no Diário Económico.
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