sábado, junho 26, 2010

Democracia ferida de morte

“O país é governado por uma coligação de procuradores e jornais”, afirmou esta semana Henrique Granadeiro em entrevista ao Jornal de Negócios. Temo que “governado” não seja o termo adequado. Seria mais correcto dizer que o país se vai tornar progressivamente ingovernável por força de uma coligação entre péssimas investigações e jornalismo tablóide. Não são só os desequilíbrios orçamentais, a nossa situação política é também insustentável porque a justiça, nos processos mediáticos, compensa frequentemente a sua incapacidade de produzir prova com a disseminação de informação falsa e a conta-gotas em órgãos de comunicação que se têm prestado a essa função. Com consequências: fica sempre a pairar uma nuvem de suspeição sobre todos – inocentes e culpados – combinada com uma total incapacidade de apurar a verdade. Se, por um lado, ser político passou a ser uma profissão de risco, por outro a imagem dos agentes da justiça deteriorou-se a um ritmo só comparável com a dos políticos. Deveria ser uma prioridade quebrar a espinha a esta coligação indomável entre alguns procuradores incompetentes e péssimos jornalistas que está a ferir de morte a democracia. Mas é duvidoso que tal seja possível. A classe política não o pode fazer pois não só nenhum partido está imune a processos mediáticos, como os políticos se degradaram progressivamente. Resta uma possibilidade. Um Presidente da República que use a sua gravitas para liderar este combate, até porque esta missão é a única relevante que resta a um chefe de Estado. Mas também aqui é escusado depositar quaisquer expectativas. Tanto o Presidente como os candidatos que se perfilam, para além de nunca terem relevado vontade política nesse sentido, têm sido complacentes com o desvario justicialista acomodado pelos media.
publicado hoje no i.