Uma questão de oportunidade
Como seria de esperar, o Presidente da República, na sequência do caso Moura Guedes, chamou a atenção para os riscos que corre a liberdade de expressão.
Há boas razões para o fazer, mas a liberdade de expressão, como se tem visto, infelizmente, não se defende nem com indignação colectiva, nem com auto-regulação. É aqui que importa recordar a Lei do pluralismo e da não concentração dos media. Não era certamente uma Lei totalmente equilibrada - levantava, por exemplo, alguns problemas de operacionalização - mas era um passo claro no sentido de regular o sector.
Um aspecto decisivo para a defesa da liberdade de expressão passa pela autonomia das decisões editoriais face aos detentores do capital e às administrações das empresas. As especificidades do negócio da comunicação social a isso o obrigam. Ora o que temos hoje, face à não promulgação da Lei, é um vazio que possibilita, de facto, que os detentores de um grupo económico intervenham directamente nas decisões editoriais. Deixemos agora de lado a discussão sobre a bondade do afastamento de Moura Guedes, a verdade é que foi esse vazio legal que permitiu que, consoante as versões, os donos da Media Capital ou a administração tivessem passado por cima das chefias editoriais e afastassem a "jornalista". Se há indícios ou mesmo provas cabais de que, cada vez mais, a autonomia editorial das redacções se encontra limitada por força de um intervencionismo das administrações que ameaça a liberdade de expressão, esse problema agrava-se quando, como já acontece em alguns casos em Portugal, nem sequer sabemos quem são os proprietários dos órgãos de comunicação social.
Sobre estes dois aspectos, a lei do pluralismo não podia ser mais clara. No seu artigo 26º, afirmava-se que ficava "vedado a qualquer pessoa que não exerça cargo (...) na área da informação a emissão de directivas, instruções ou qualquer tipo de intromissão que incida sobre os conteúdos de natureza informativa veiculados ou sobre a forma da sua apresentação". Já nos artigos 5º e 7º ficava definida a obrigação pública da divulgação da titularidade dos media, bem como de toda a cadeia de entidades à qual deve ser imputada uma participação qualificada.
Não é preciso fazer um grande exercício de memória para nos recordarmos do veto do Presidente a esta lei, após o voto contra de toda a oposição. Entre outros argumentos, era afirmado que não era oportuno legislar. Imagino que o critério da oportunidade já esteja presente, o problema é que não há nada pior do que criar regras gerais perante casos concretos. Mas, claro, é sempre mais fácil fazer declarações grandiloquentes do que regular em abstracto.
publicado no Diário Económico.
Há boas razões para o fazer, mas a liberdade de expressão, como se tem visto, infelizmente, não se defende nem com indignação colectiva, nem com auto-regulação. É aqui que importa recordar a Lei do pluralismo e da não concentração dos media. Não era certamente uma Lei totalmente equilibrada - levantava, por exemplo, alguns problemas de operacionalização - mas era um passo claro no sentido de regular o sector.
Um aspecto decisivo para a defesa da liberdade de expressão passa pela autonomia das decisões editoriais face aos detentores do capital e às administrações das empresas. As especificidades do negócio da comunicação social a isso o obrigam. Ora o que temos hoje, face à não promulgação da Lei, é um vazio que possibilita, de facto, que os detentores de um grupo económico intervenham directamente nas decisões editoriais. Deixemos agora de lado a discussão sobre a bondade do afastamento de Moura Guedes, a verdade é que foi esse vazio legal que permitiu que, consoante as versões, os donos da Media Capital ou a administração tivessem passado por cima das chefias editoriais e afastassem a "jornalista". Se há indícios ou mesmo provas cabais de que, cada vez mais, a autonomia editorial das redacções se encontra limitada por força de um intervencionismo das administrações que ameaça a liberdade de expressão, esse problema agrava-se quando, como já acontece em alguns casos em Portugal, nem sequer sabemos quem são os proprietários dos órgãos de comunicação social.
Sobre estes dois aspectos, a lei do pluralismo não podia ser mais clara. No seu artigo 26º, afirmava-se que ficava "vedado a qualquer pessoa que não exerça cargo (...) na área da informação a emissão de directivas, instruções ou qualquer tipo de intromissão que incida sobre os conteúdos de natureza informativa veiculados ou sobre a forma da sua apresentação". Já nos artigos 5º e 7º ficava definida a obrigação pública da divulgação da titularidade dos media, bem como de toda a cadeia de entidades à qual deve ser imputada uma participação qualificada.
Não é preciso fazer um grande exercício de memória para nos recordarmos do veto do Presidente a esta lei, após o voto contra de toda a oposição. Entre outros argumentos, era afirmado que não era oportuno legislar. Imagino que o critério da oportunidade já esteja presente, o problema é que não há nada pior do que criar regras gerais perante casos concretos. Mas, claro, é sempre mais fácil fazer declarações grandiloquentes do que regular em abstracto.
publicado no Diário Económico.
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