O Regresso do MRPP
Não será fácil precisar a data, mas não andaremos longe da verdade se dissermos que o pecado original ocorreu aquando da tomada de posse deste governo. Com o discurso da “tanga” estava dado o tom. A partir daí tem sido uma espiral imparável. Insultos atrás de insultos, discurso político indigente e lama, muita lama. Se a isto somarmos a crise económica e o desemprego temos o próprio regime democrático enredado num lamaçal, do qual parece sempre mais difícil sair.
Verdade seja dita que, um pouco por todo o Ocidente, dois séculos de Parlamentos modernos sempre se caracterizaram pelo debate aceso, pela troca de galhardetes e pela ironia mordaz. Mas, aquilo a que temos assistido entre nós, nos últimos tempos, indicia algo de novo. Algo de novo, porque os dislates injuriosos da Ministra Ferreira Leite, as piadolas do deputado Telmo Correia ou o recente disparatismo vergonhoso dos deputados João Almeida e Ana Manso, não são actos isolados, pois têm cobertura no tom e na postura do Primeiro-Ministro. O que antes se circunscrevia à disputa parlamentar hoje passou a ser um instrumento do “debate” político ao qual o Primeiro-Ministro recorre com demasiada frequência. Há uma diferença substancial entre dois deputados que se envolvem em picardias e uma picardia de um deputado à qual responde com inusitada violência o próprio chefe de governo. Com o dr. Durão Barroso, já se percebeu, é sempre assim. O Dr. Louçã levanta a voz, dispara e logo o Dr. Durão sobe a parada e responde à altura, tudo como se o país fosse uma imensa RGA no PREC.
Claro que as televisões gostam do enredo e entre “meninos” que falam sempre verdade, treinadores que exercitam o seu autoritarismo de pacotilha e casos reais da vida, os telejornais lá deixam um espaço para as discursatas acesas dos políticos. De tudo o resto que vai existindo na política para além disto, sobra apenas um imenso vazio mediático. E o que fica é a imagem de toda a política como farsa e actividade circense que, ao mesmo tempo que se torna mediaticamente apelativa, consolida o sentimento crítico de quem vê e intensifica a desconfiança face a todo o sistema democrático. E no entretanto, as causas e as consequências é que se diluem umas nas outras: abstenção galopante, descrédito crescente nas instituições políticas e um imenso nacional-pessimismo.
É evidente que há tendências de fundo que explicam a política feita insulto que parece ter vindo para ficar, mas há também factores idiossincráticos e especificidades do tempo e do lugar. À cabeça destes está o regresso, trinta anos depois, do MRPP à cena política nacional. É que não é só o Primeiro Ministro que guarda os tiques e o estilo do camarada Veiga, é todo a coligação que parece contagiada pela agressividade, pelo radicalismo, pela gritaria. Aliás, isto leva a pensar se não se terá assistido a uma silenciosa mas conseguida estratégia “entrista” do MRPP no PSD/CDS, que só agora dá os seus frutos. E, trinta anos depois, convém termos presente que a utilização instrumental das instituições da democracia dita burguesa só pode resultar numa coisa, a sua decadência e substituição por algo inevitavelmente pior.
artigo publicado na Capital
Verdade seja dita que, um pouco por todo o Ocidente, dois séculos de Parlamentos modernos sempre se caracterizaram pelo debate aceso, pela troca de galhardetes e pela ironia mordaz. Mas, aquilo a que temos assistido entre nós, nos últimos tempos, indicia algo de novo. Algo de novo, porque os dislates injuriosos da Ministra Ferreira Leite, as piadolas do deputado Telmo Correia ou o recente disparatismo vergonhoso dos deputados João Almeida e Ana Manso, não são actos isolados, pois têm cobertura no tom e na postura do Primeiro-Ministro. O que antes se circunscrevia à disputa parlamentar hoje passou a ser um instrumento do “debate” político ao qual o Primeiro-Ministro recorre com demasiada frequência. Há uma diferença substancial entre dois deputados que se envolvem em picardias e uma picardia de um deputado à qual responde com inusitada violência o próprio chefe de governo. Com o dr. Durão Barroso, já se percebeu, é sempre assim. O Dr. Louçã levanta a voz, dispara e logo o Dr. Durão sobe a parada e responde à altura, tudo como se o país fosse uma imensa RGA no PREC.
Claro que as televisões gostam do enredo e entre “meninos” que falam sempre verdade, treinadores que exercitam o seu autoritarismo de pacotilha e casos reais da vida, os telejornais lá deixam um espaço para as discursatas acesas dos políticos. De tudo o resto que vai existindo na política para além disto, sobra apenas um imenso vazio mediático. E o que fica é a imagem de toda a política como farsa e actividade circense que, ao mesmo tempo que se torna mediaticamente apelativa, consolida o sentimento crítico de quem vê e intensifica a desconfiança face a todo o sistema democrático. E no entretanto, as causas e as consequências é que se diluem umas nas outras: abstenção galopante, descrédito crescente nas instituições políticas e um imenso nacional-pessimismo.
É evidente que há tendências de fundo que explicam a política feita insulto que parece ter vindo para ficar, mas há também factores idiossincráticos e especificidades do tempo e do lugar. À cabeça destes está o regresso, trinta anos depois, do MRPP à cena política nacional. É que não é só o Primeiro Ministro que guarda os tiques e o estilo do camarada Veiga, é todo a coligação que parece contagiada pela agressividade, pelo radicalismo, pela gritaria. Aliás, isto leva a pensar se não se terá assistido a uma silenciosa mas conseguida estratégia “entrista” do MRPP no PSD/CDS, que só agora dá os seus frutos. E, trinta anos depois, convém termos presente que a utilização instrumental das instituições da democracia dita burguesa só pode resultar numa coisa, a sua decadência e substituição por algo inevitavelmente pior.
artigo publicado na Capital
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